Franny e Zooey (J.D. Salinger)

quarta-feira, 5 de agosto de 2020


Escrito em 1961, «Franny e Zooey», de J.D. Salinger é um livro que reúne dois contos, inicialmente publicados separadamente. Pelas temáticas que se cruzam, numa continuidade muito nítida, os contos acabaram por ser reunidos num único volume, este, de que hoje vos falo.

Ao longo do livro conheceremos a família Glass, dotada de uma inteligência muito afinada e com especial ênfase nos dois filhos mais novos do casal: Franny e Zooey, fortemente influenciados pelos seus dois irmãos mais velhos.

No primeiro conto, «Franny», conheceremos uma jovem perdida e desiludida no ambiente da faculdade, cansada das pessoas, do ego desmedido, numa reflexão aprofundada com o namorado sobre o seu lugar no mundo. A desilusão que invade a jovem ganha forma no confronto com um livro em particular, «O Caminho do Peregrino», de carácter religioso. Desde aí a leitura do livro torna-se compulsiva e a religiosidade, nas mais diversas formas, toma lugar. Acaba por adoecer, do corpo e da alma.

O segundo conto apesar de, aparentemente, se focar no seu irmão mais novo, Zooey, continuamos a viver o conflito existencial de Franny. A mãe, sempre preocupada em como inteligência mordaz dos filhos os poderia arruinar, convoca o irmão para que, através de uma conversa que será profunda, possa ajudar a irmã a reerguer-se do torpor que a invadiu, quase sem explicação.

É essa conversa o grande motor deste livro, na minha opinião. O autor lança um claro apontar de dedo à religião cristã, criticando severamente a ideia de que para sermos merecedores, temos de sofrer amargamente. A psicologia é igualmente apresentada como o mal de todos os pecados, que levou o irmão mais velho ao suicídio tal a tendência de chafurdar na dor para, enfim, adormecer a alma.

A genialidade dos irmãos é vivida num sinónimo de sofrimento porque faz questionar, constantemente, o seu lugar no mundo, a missão, o que é suposto ser feito. Isso cansa, cresce a vontade de desistir de tudo, desse empurrão desmedido de um ego que quase nos obriga a ser quem não somos, a fazer o que não queremos, a viver longe das próprias leis.

"(...) Estou farta de não ter coragem para ser um zé ninguém."

Só uma pessoa altamente inteligente é capaz de sentir este tipo de cansaço e a vontade de ser nada, mediado pela distância que vai do parecer ao ser. Ambos os irmãos estão cansados desse torpor em que a vida os foi envolvendo.

Se até este momento o leitor quase cai desesperançado, é quando o autor decide, como só ele sabia fazer, lançar uma esperança capaz de ser interpretada por toda a gente, como melhor lhe convém. E essa esperança vem abraçada ao Budismo e à crença de que todos nós temos um Deus muito próprio que nos habita. É também um elogio à meditação como o caminho, a porta e a janela que nos leva a esse lugar tão nosso e tão longe da matéria, do ego. O lugar onde tudo acontece somos nós, de dentro para fora, de encontro a uma consciência que se expande, clarificando os passos dados e enchendo-nos dessa esperança que é arnês. É o princípio dos princípios.




Um livro belíssimo.

💓


Seja feliz,

2 comentários:

" R y k @ r d o " disse...

Acredito que seja um livro interessante de ler
.
Abraço

Bárbara Ferreira disse...

os irmãos Glass são todos fascinantes! que inveja que tenho por ainda teres Salinger por ler :)

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