A Dádiva (Toni Morrison)

sábado, 29 de setembro de 2012

Por muito que pense na trajectória deste livro, a única coisa que me faz parar para pensar é, de facto, na tristeza e tormenta que reina em todas as personagens. Há um cinzento muito substancial em todas elas. É um cinzento, ao contrário do que se possa pensar, realmente poderoso.
Acredito que é o sofrimento a chave do poder, não a felicidade. A felicidade é fumo, faz esquecer as coisas mais importantes, torna tudo um pouco fugaz...
O sofrimento, esse, é pesado e permite ganhar a força da vontade. A vontade da liberdade, de nos libertarmos desse fardo, de voltarmos a ser leves, um dia. Quem sabe?
 
Apesar de, inicialmente, a leitura deste livro ser profundamente confusa, vale sem dúvida, continuar até à última página. Recomendo.
 
 
Sinopse em www.wook.pt: Da autoria da primeira mulher negra a ser distinguida com o Prémio Nobel da Literatura (1993), A Dádiva é um romance extraordinário que se passa na América do Norte de finais do século XVII. Profundas divisões sociais e religiosas, opressões e preconceitos exacerbados propiciam o cenário ideal para a implantação da escravatura e do ódio racial. Jacob Vaark é um comerciante anglo-holandês que apesar de se manter à parte do negócio dos escravos, que então dá os primeiros passos, acaba por aceitar uma menina negra, Florens, como pagamento de uma dívida de um fazendeiro de Maryland. Nesta parábola do nascimento traumático dos Estados Unidos, Morrison revela-nos o que se esconde sob a superfície de qualquer tipo de sujeição, incluindo a da paixão, e o quanto essa falta de liberdade é nociva para a alma.
 

Onze Minutos (Paulo Coelho)

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

 
 
Não aprecio o trabalho de Paulo Coelho. Já li vários dos seus livros para que possa dizer, abertamente, que não aprecio. No entanto, hoje há esta emergência em dissertar sobre as relações, afectos, seja lá o que isso for. Acerca disso, este livro contém algo de interessante, devo confessar. 
O grande propósito do mundo resume-se a onze minutos que a Maria não se importa de vender.
A questão aqui não são as prostitutas que, muito honestamente, respeito. Apenas prestam um serviço e recebem por ele. O que não respeito, ora desculpem lá, são as prostitutas de borla disfarçadas com grandes trajes, vocacionadas a estragar o que de bom há em quatro paredes.
Há valores perdidos em todos os lugares, em gavetas decoradas a pó, em armários forrados a segredos doentios. Uma miséria.
Todos querem ser felizes. Uma felicidade unilateral. Uma felicidade de onze minutos. Onde apenas um ganha, e muitos outros perdem.
Depois falam, também, em amor. Com a boca suja, ou com hálito de cebola...
Sem contexto. Sem lugar. Sem direito.
 
 
 
Já temos o comprimido azul.
Fabriquem um comprimido cor-de-rosa, que revitalize almas em extinção.
 
 
Porque também vivemos uma (triste) crise emocional.
 
 
Sinopse em www.wook.pt: "Era uma vez uma prostituta chamada Maria..."É assim como um conto de fadas para adultos, que começa este novo romance de Paulo Coelho.
É uma abordagem franca e uma profunda sensibilidade que o autor de O Alquimista conta esta história sobre os mistérios do amor e o poder da sexualidade.
Maria, uma mulher oriunda de uma pequena cidade do Brasil, descobre rapidamente o poder que a sua beleza exerce sobre os homens. Desiludida com o amor romântico e desencantada com a paixão, é levada a trabalhar numa boîte na Suiça, onde aprende a viver do sexo e a utiliza-lo para satisfazer os outros. Mas à medida que se vai aperfeiçoando e criando o distanciamento necessário entre si e o seu corpo, sente cada vez mais que está a deixar morrer uma parte importante de si.
A história de Maria é a história de uma mulher que ousa transgredir e desafiar a estrutura de uma vida banal para descobrir o poder redentor da paixão. O erotismo e a sensibilidade de Onze Minutos constituem uma reflexão profunda sobre a história e a natureza da sexualidade e o papel que desempenha na busca do sagrado.


Pastagens do Céu (John Steinbeck)

terça-feira, 25 de setembro de 2012

 
A única coisa que me apetece dizer neste momento é John Steinbeck é o meu escritor preferido. Ah pois. Eu consigo escolher.
John Steinbeck é o meu escritor preferido.
Quando disse a um Professor que queria ser escritor, este disse-lhe que o seria quando os porcos conseguissem voar. Ei-lo, para mim, o melhor dos melhores.
 
Não acreditem em tudo o que vos dizem.
 
 
 
O Outono chegou. A estação mais linda do ano chegou.
Com ela chegou o início da minha felicidade.
 
Como sempre, às pessoas com espírito.
Hoje estas palavras são inteiramente para ti.
Estejas onde estiveres, eu sei que estás a partilhar tudo comigo.
 
 
 
www.wook.pt: Ao longo de doze histórias interligadas, tendo por cenário um vale fértil da Califórnia, John Steinbeck retrata, de forma deslumbrante, os fracassos e as fragilidades, os sonhos e as ilusões, que por vezes destroem insidiosamente as promessas das «pastagens do céu». Através da descrição de acontecimentos aparentemente irrelevantes que tantas vezes transformam de forma decisiva as vidas das pessoas, Steinbeck lança muitos dos temas que virão a marcar as grandes obras da sua maturidade. Cada uma destas histórias está ligada às restantes pela presença, em todas elas, dos Munroe, uma família cujo comportamento disfuncional e cuja falta de sensibilidade provocam, não raras vez, desastres e até mesmo tragédias. Pastagens do Céu é a crónica dramática de uma decadência, na qual, por culpa de alguns, vão pouco a pouco perecendo a harmonia e as esperanças que durante muito tempo estruturaram a vida de toda uma comunidade.

 

Citação

segunda-feira, 24 de setembro de 2012










"Pode-se ter saudades dos tempos bons mas não se deve fugir ao presente."
 
(Michel de Montaigne)
 
 
 
Com ou sem dúvida? Sem dúvida.
Com ou sem dor? Com dor.
Mas, absolutamente, sem dúvida.
 
 


Ziguezague (Matthew Klein)

domingo, 23 de setembro de 2012



Quando penso na possibilidade, de acordo com o trabalho do Dr. Ho, em fazerem-se cópias de segurança das nossas mentes, das nossas personalidades, pondero sobre a quem gostaria de deixar a minha.
E a resposta mais simples seria: "... penso que a ninguém."
Creio que passamos a vida a fazer figuras de palhaço, sem nada contra este último. Mas passamos, sem dúvida.
Há uma necessidade estranha de heroísmo. Necessidade de timbrar a nossa presença pelo mundo fora, pelo mundo das pessoas que, supostamente, amamos perdidamente.
Enfim. Dou comigo a rir perdidamente. Sem palhaços no armário, sem efeitos secundários. A rir genuinamente dessas desgraças, desses sonhos humanos, incompreensíveis da parte que me toca, e que jamais tocará.
De acordo com essa "troca por troca", eu não daria as minhas cópias de segurança a ninguém. Sendo a construção do amor uma rígida e repetida "troca por troca", que se lixe lá isso...!


Para os egoístas.
 


Um livro a reter. Mais que não seja pela nota de egoísmo estampada em cada página. Pela avareza, pela decepção e sobretudo, pela ... surpresa.
 

Sinopse em www.wook.pt: Timothy van Bender, formado em Yale e dono de uma empresa em Palo Alto, tem uma vida mágica: os negócios correm bem, a mulher, Katherine, é bela e encantadora, e a secretária, Tricia, cumprimenta-o todas as manhãs com um sorriso galanteador. Subitamente, tudo muda. Um dia Timothy acorda e descobre que perdeu vinte e quatro milhões de dólares numa má aposta na bolsa. À beira da bancarrota, recebe uma chamada da mulher, dizendo-lhe adeus, antes de se atirar de um precipício. Nem a polícia local nem Timothy conseguem acreditar o sucedido. Começam os problemas. Enquanto a polícia investiga o empresário, este tenta descobrir os segredos da sua falecida mulher. Porém, quando Tricia lhe bate à porta, afirmando ser a sua mulher, revelando segredos que só Katherine podia saber, Timothy perde-se num labirinto sem saber em quem ou no que acreditar. Terá ele outra oportunidade para ser feliz ou estará enredado numa teia que o levará à morte?


O Quinto Filho (Doris Lessing)

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

As mulheres, depois de terem um filho, ganham uma mania estranha: a mania que cresceram. A mania que agora, agora sim, são verdadeiras mulheres. Melhores. Melhores mulheres. Há um certo instinto protector, há algo de estranhamente forte nelas, agora.
É verdade, os estudos também assim o dizem, inclusive, o próprio cérebro se reestrutura para que essa força protectora ganhe forma, das formas mais estranhas possíveis.
É, das formas mais estranhas possíveis. Porque... de facto, por vezes, é estranho a forma como uma mãe protege um filho. Este é mais um livro perturbador onde se sublinha essa protecção maternal, sem sombra de dúvida bela, mas paralelamente, assustadora. Levada a extremos?
Não sei, mas não deixa de ser arrepiante este quinto filho.
Mais arrepiante ainda, a protecção maternal.
E se, no entanto, parecia arrogante ao dizer que as mulheres ganham uma mania estranha ao serem mães, estava longe disso: é arrepiante no sentido em que nada importa, nada conta, nada faz sentido se a segurança de um filho, não mora em si mesma.
Custe o que custar. A quem custar.
 
Não diria que se trata de um livro macabro, mas quase. É perturbante.
 
 
www.wook.pt: Harriet e David Lovatt têm os mesmos anseios - fidelidade, amor, vida familiar e, acima de tudo, um lar. Teimosamente fora das modas dos anos 60, decidem casar e assentar as bases das suas vidas numa casa vitoriana. A princípio, parece o Paraíso. As crianças preenchem-lhes o quotidiano, e os familiares sentam-se à mesa da cozinha no Natal, desfrutando avidamente do calor humano da família Lovatt. Mas é com a quinta gravidez que as coisas começam a alterar-se. O bebé desenvolve-se dentro de Harriet demasiado cedo e com demasiada violência. Após um nascimento difícil, Ben revela-se uma criança estranha e cruel, cuja violência é instintivamente rejeitada pelos irmãos.
Inexoravelmente, a sua presença alienígena vai destruindo o sonho de uma família feliz.
 
 


A Condessa (Rebecca Johns)

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Baseado em factos verídicos, esta é a história da Condessa Húngara Erzsébet Bathóry, que após os horrendos, e macabros, assassinatos das suas criadas, ficou drasticamente conhecida como a "Condessa do Sangue".
Para quem desconhece, o início da leitura compra uma ansiedade ao leitor, que ainda guarda uma esperança sobre a condessa, tal é a certeza imaculada quanto à sua inocência, quanto à legitimidade dos seus actos. Actos baseados em (falta de) amor. Amor correspondido, mas não totalmente, não fielmente, não correctamente. Algo que uma condessa não poderá tolerar.
Este é um relato em que é possível sublinhar a necessidade de poder, a sua ostentação e, simultaneamente, a sua impotência. Tudo e nada ter. O poder da condessa, mesmo incontestável, esse tudo poder, não a resguardou daquilo que mais queria: um amor absoluto, dedicado: um amor belo.
Independemente do poder conquistado desde a infância, pelo esforço que só uma personalidade de ferro o alcança, o amor, esse, não dependia das pratas que brilhavam pela casa, nem tão pouco dos terrenos passados em seu nome. Não dependia de nada, de nada que estivesse ao seu alcance, nas suas mãos.
Mulher de poder, ao ver o seu amor diluir-se e transferir-se para o corpo das criadas, essas miseráveis prostitutas, gordas, de olhos baços ou pele gasta, permitiu-lhe ganhar novamente esse poder inflamado de quem não controla o que mais quer.
Agora, novamente com o poder nas mãos, literalmente nas mãos, ceifou as esperanças de ser amada, mas escreveu a sangue o poder de que sempre acreditou ser feita. Mesmo no final.
 
Uma mente construída de acordo com o seu próprio poder. Uma mente doente.
 
Sem sombra de qualquer dúvida, um livro macabro. Um livro perturbante, que retrata a vida daquela que consideram a primeira assassina em série da história. Recomendo.
 
 
www. wook. pt: A bela condessa Erzsébet Báthory nasceu num berço de ouro da aristocracia húngara. Nada faria prever que acabaria os seus dias encarcerada na torre do seu próprio castelo. O seu crime: os macabros assassínios de dezenas de criadas, na sua maioria jovens raparigas torturadas até à morte por desagradarem à sua impiedosa senhora.
Pouco antes de ser isolada para sempre, Erzsébet conta a apaixonante história da sua vida. Ela foi capaz dos mais cruéis actos de tortura mas também do mais apaixonado e intenso amor. Foi mãe, amante, companheira… uma mulher que teve o mundo a seus pés e se transformou num monstro.
Os seus opositores retrataram-na como uma bruxa sanguinária, um retrato que fez dela a mulher mais odiada da História. Erzsébet inspirou Drácula, inscreveu-se na literatura clássica e contemporânea, deu azo a filmes, séries de TV e até jogos de computador.
 


Gabriela, Cravo e Canela (Jorge Amado)

segunda-feira, 17 de setembro de 2012


É bom imaginar e perceber a magia que determinadas personagens podem semear na vida das pessoas e, sem dúvida, Gabriela, a mulher com cheiro de cravo e cor de canela, é uma dessas personagens intemporais de Jorge Amado.
Adaptada para telenovela, em 1977, gerou-se uma quase (nova) revolução em torno de Gabriela, mulher da natureza, mulher de todos e de ninguém, mulher livre, que gosta de deitar, porque sim, que gosta de homem, porque sim, mas amar... só seu Nacib. Homem bom, moço bonito.
Um espírito livre. Uma mulher por muitos difícil de entender, exactamente por isso, por ser de todos, e não ser de ninguém.
"Não é flor de jarro", dizia João Fulgêncio.
Gabriela é ... simplicidade. Nasceu assim, cresceu assim, e será... sempre assim.
 
É impossível não amar esta mulher!
 
 
Por muitas adaptações que façam, nada se compara à leitura deste livro que envolve, que abraça e que não permite esquecer.
 
 
Ao som de: Gal Costa "Modinha para Gabriela"
"Eu sou sempre igual, não desejo o mal, amo o natural, etc e tal" ;)
 

As Ondas (Virgínia Woolf)

domingo, 16 de setembro de 2012

Vozes. Seis vozes num diálogo interno, só para si. Numa onda perdida em si mesma. Imagens vagas.
Um desespero. Uma leitura desesperada. Difícil, cujas personagens se escondem em si, numa onda perdida e simultaneamente, na ânsia de encontrar algo capaz de  soltar a alma emaranhada. Emaranhada numa onda incapaz de acabar. Incapaz de retornar ao que foi. Ou retorna?
Ondas. Ondas. Ondas.
 
 
O livro considerado mais alternativo de Virgínia Woolf. Cada personagem tem mérito próprio, tem o seu próprio discurso, seguindo a sua própria onda, como deseja.
 
E como assim deveria ser, sempre. Na vida.
 
 
Lido, também, há uns bons anos.
Bem retido na alma, este livro eu recomendo com ambas as mãos.
 
Obrigada, Joana! ;)
 
Continuo a dedicar todas as minhas palavras às pessoas com espírito. 
 

 
Ao som de: Fun "Some Nights"


Antes de nos encontrarmos (Maggie O'Farrell)

sábado, 15 de setembro de 2012

Hoje sonhei com este livro. Há com cada coisa. Especificamente com este livro.
Já o li há uns anos, em 2009 talvez.
Ela. Uma necessidade urgente de fuga, não interessa para onde, mas essa urgência empurra. Empurra. Empurra.
Ela vai, e continua a fugir por uma estrada sem fim, apenas com a urgência nas pernas e o peso que só os segredos conseguem conceder.
Ele. Uma ansiedade no coração, amarras às quais jamais se quis comprometer.
Um caminho desconhecido. Um encontro. Uma mudança. O medo de tecer novos segredos. Depois se de encontrarem.
 
 
Ainda guardo as nítidas imagens deste livro. Como um filme a passar. Como as paisagens a passar enquanto andamos de carro. Há tonalidades cinzentas que guardo deste livro. Uma mensagem curiosa que ficou. Segredos que ficam, porque o são. Têm de ficar na alma. Ou com alguém, que (ainda) não se encontrou.
 
 
 
 
Ao som de: Hurts "Stay"
 
 
Sinopse www.wook.pt:  Stella e Jake estão separados por milhares de quilómetros; ela vive em Londres, e ele em Hong Kong. Nada sabem acerca da existência um do outro, mas, um dia, no mesmo instante, ambos vão viver experiências que os levarão a deixar tudo para trás e, sem o saberem, a encurtar a distância geográfica e emocional que os separa, ao encontro um do outro e de si mesmos. Começa assim uma narrativa em que, pouco a pouco, nos são desvendadas duas histórias, que percorrem várias gerações, sobre identidades desenraizadas, os laços que nos unem e o apelo inconsciente do passado e dos seus segredos.
 


Liberdade (Jonathan Franzen)

quinta-feira, 13 de setembro de 2012



No presente caso, vou deixar de lado as minhas conhecidas divagações aquando do livro fechado. Vou cingir-me às quase 700 páginas de Franzen. E daí, não. Não sei se sou capaz de tamanha provação! :)
Este é um livro envolto em muitas críticas, sobretudo, pela malograda frase "O Grande Romancista do Ano" (Time).
A verdade é que estamos perante um grande livro. As questões de catalogação quanto ao grande, médio ou pequeno romancista do ano, isso já não me cabe a mim referir. A questão verdadeiramente interessante para mim é, sem dúvida, o conteúdo das (quase) 700 páginas, essas sim, grandes e dotadas de conteúdo que ficam impregnadas na mente, e na alma, após o término da leitura. Depois de Ler(-te). O que para mim é o sinónimo dos grandes livros.
Somos uma cambada de tolos. É essa a ideia central com que fico ao acabar de Ler(-te).
Liberdade: Condição do ser que pode agir livremente, isto é, consoante as leis da natureza (queda livre), da sua fantasia, da sua vontade (decisão livre). (Dicionário da Língua Portuguesa).
Somos conduzidos por três personagens principais que são tudo menos aquilo que dizem ser, sob uma cortina política que o autor faz questão de sublinhar a carvão.
A ideia de todo este enrendo é que passamos a vida a procurar o caminho nos sapatos dos outros, a melhor paisagem é a da janela da casa vizinha, a suposta felicidade vive sempre ao lado. Procuramos essa tal liberdade fora da nossa casa, cada vez mais decadente à força dos dias, onde os ideais se dissipam cada vez mais, onde tudo se torna cada vez mais cinzento, e onde nada parece fazer sentido, a não ser para lá das portas dessa mesma casa, tão ideal aos olhos dos vizinhos. Ou suspeita. Boa demais.
Um dia, porém, a força dos ideais rebenta. As amarras da moralidade já não são assim tão fortes, e parte-se, com uma coragem baça, a caminho dessa cobiçada liberdade, cheia de promessas com regressões a tempos antigos, onde viviam os melhores momentos, as certezas de felicidades não agarradas.
Somos uma cambada de tolos. A experiência de regressar a esse sonho de liberdade, afinal, só lhes faz ter a certeza de que a felicidade, de que a sensação de plenitude já a conheciam antes. Que a sempre tiveram. Era preciso perder, para saborear, agora.
A questão, no entanto, é que após a perda, o regresso nunca jamais será o mesmo. Nem sentido da mesma forma. E a liberdade essa, bem, nunca será alcançada.
Eternamente almejada.
 
Jonathan Franzen, através das vidas cinzentas de Patty, Walter e Richard retrata não só a decadência familiar, mas também o cenário político dos Estados Unidos da América, cruzando de forma muito consistente os sentimentos, valores e ideais num enredo incapaz de largar.
 
Recomendo vivamente.
 
Ao som de: John Mayer "Shadow Days"
 
Sinopse de www.wook.pt. No seu primeiro romance depois de Correcções, Jonathan Franzen dá-nos um épico contemporâneo do amor e do casamento. Liberdade capta, cómica e tragicamente, as tentações e os fardos da liberdade: a excitação da luxúria adolescente, os compromissos abalados da meia-idade, as vagas da expansão suburbana, o enorme peso do império. Ao seguir os erros e alegrias dos personagens de Liberdade, enquanto lutam para aprender a viver num mundo cada vez mais confuso, Franzen produziu um retrato inesquecível e profundamente comovente dos nossos tempos. Patty e Walter Berglund foram sempre os precursores na velha St. Paul - os aburguesados, os pais interactivos, os avant-garde da geração de alimentos biológicos. Patty era o tipo ideal de vizinha, que nos podia dizer onde reciclar as pilhas e como conseguir que a polícia local fizesse mesmo o seu trabalho. Era uma mãe invejavelmente perfeita, e a mulher dos sonhos do seu marido Walter. Juntamente com ele - advogado ambientalista, ciclista e utilizador de transportes públicos, homem de família dedicado -, Patty estava a fazer a sua pequena parte para construir um mundo melhor.
 

Ethan Frome (Edith Wharton)

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

 

Dizem que as mulheres são dotadas de um sexto sentido capaz de derrubar paredes. Acredito que quando os assuntos do coração emergem, esse sexto sentido ganha mais cor, mais vivacidade, mais textura, mais garra. Salta do peito, transforma-se na sua força, sente-se nas mãos, queima no peito e salta para fora da razão, incapaz de ver e sentir qualquer moralidade. O certo passa a morar numa porta ao lado, uma porta muito distante.
Assim acontece em «Ethan Frome». Poder-se-ia dizer que a sensível e aparentemente indiferente mulher, não seria dotada desse enfeitiçado sexto sentido.
Um corpo feito de fraqueza, doença, fragilidade. No entanto, o amor tem uma componente de atenção ao detalhe do roubo, capaz de apagar qualquer sinal de inferioridade e acusar, assim, o que lhe é de direito.
Há uma perturbação permanente na leitura deste livro. O amor é aqui retratado como uma fatalidade do destino, como algo terrivelmente ameaçador, sob diversos ângulos: o desejo de se ser feliz é contornado pelas responsabilidades de uma vida que Ethan Frome nunca desejou, mas a que sempre se viu confrontado.
No único momento em que pretende largar-se das amarras de uma responsabilidade imposta, procurando pela primeira (e última) vez um trago de felicidade, um destino cruel assegura-lhe a estadia vitalícia daquele lugar gélido, não se devendo apenas à neve constante. Um lugar gélido das três almas que habitarão para sempre aquela casa.
E depois, bem, depois resta-nos pensar na Srª Frome e no seu sexto sentido apurado: também ela vítima do amor, aparentemente indiferente. Poderia ela imaginar que as suas intenções, esquecidas de moralidade, a prenderiam para sempre?

Recomendo.
 
Sinopse Publicações Europa-América: O cenário para esta história é a localidade de Starkfield, onde, malgrado o azul-fortíssimo dos céus, a desolação do frio e da neve parece instalar-se nos corações dos que aí habitam. Acorrentado à quinta onde vive, a princípio pelos pais, criaturas fracas e impotente, e depois por Zeena, a esposa, criatura rabugenta e hipocondríaca, Ethan Frome vai conseguindo o suficiente para sobreviver. É então que a prima de Zeena, a encantadora Mattie Silver, se lhes junta para trabalhar na quinta. O clima incrivelmente tenso em que os três mergulham arrasta consigo consequências devastadoras.


Amor e Amizade (Jane Austen)

domingo, 9 de setembro de 2012

Se dou comigo a questionar-me sobre as inúmeras grandezas do tempo, esqueço-me de mim, agora, e adormeço nos seus recantos mais confortáveis. Se essas suas capacidades são tão gigantescas, como em mim faço crer, então, é possível retroceder e encontrar outras pessoas, fragmentos de nós mesmos, e surpreender a triste alma - de uma surpresa tamanha - com quem fomos, e com quem somos, hoje.
 
Querida J.,
Como é possível amar tanto uma pessoa e essa mesma pessoa nem sequer pressentir a nossa presença, no seu mundo? Continuo crente de uma mudança nos afortunados olhos desse teu primo, quem sabe, um dia, e tudo poderá mudar nesta minha vida aflita, desde o dia em que, juntas, o pude ver pela primeira vez. Ainda te lembras desse dia, querida amiga? Já eu, nem me digno a colocar tal questão, pois todo o meu ser se alterou, e minha alma encolheu, desde esse dia!
Aguardo, com o desespero da saudade e da amizade que te tenho, as tuas novidades. O amor pelo M. cresce a cada dia, presumo?
Escreve-me!
 
Adieu,
D.C.
 
Outubro, 1999
 
 
 
A leitura deste primeiro livro da Jane Austen, escrito aos 15 anos,  repleto de amor e amizade sob forma de preciosas cartas, não me deixou alternativa a fazer-te uma enorme dedicatória.
 
Cartas: a melhor tradução para amor e amizade. Para todo o sempre.
 
 
 
A ti, Joana! :)
 
Ao som de: "Try, Try, Try" (The Smashing Pumpkins)
 
 
 
 
 
Sinopse www.wook.pt: O primeiro livro da célebre autora inglesa. Escrito quando Jane Austen tinha apenas 15 anos, Amor e Amizade é o retrato do universo que a rodeia, mais precisamente, da adolescência, dos amores e desamores.
Dividido em duas novelas epistolares e em cinco contos em forma de carta, um dos principais méritos desta obra é os paralelismos com a actualidade.
Jovens preocupadas exclusivamente com coisas de jovens (iguais às jovens de hoje), monstros de hipocrisia enquanto fazem de tudo para serem boas, amuam, acusam, perdoam, choram, escarnecem, desmaiam, gritam de prazer ou de ultraje, seduzem e rejeitam, são bondosas e cruéis, intuitivas e, contudo, obtusas.
Hoje em dia, usam os telemóveis para viverem a excitação do momento, há dois séculos escreviam cartas. Melhor do que ninguém, Jane Austen observou essa realidade e transformou-a no livro que marcou o início da sua carreia.

 
 

Madame Butterfly (John Luther Long)

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Um clássico da literatura, expandido para o teatro e criando, ainda, a intemporal ópera produzida por Giacomo Puccini, este é um livro a reter no coração. Cho Cho San entranha-se no coração, seja essa a nossa vontade, ou não.
Corpo e mente são mantidos a sonhos e ternura. Dimensões de sonhos, ternura e amor incapazes de definir, quantificar, imaginar. Tudo é tão possível nesse mundo de Madame Butterfly, as suas certezas são tão inabaláveis – como só o seu verdadeiro amor pode ser – que por momentos, a empatia pela sua ingenuidade ganha uma forma obrigatória. A dor iminente, de olhos contornados a dosagens menores de sonho, é incapaz de não querer abraçar, para sempre, esta Butterfly, esta Madame, cujos olhos são asas que voam para longe de qualquer cruel realidade.
Um dia, porém, esse mesmos olhos prudentes, a realidade pesada, obrigarão os sonhos de Madame Butterfly a voar no sentido contrário da sua felicidade e aí, a esperança traduzida no sorriso esmagador de um sonho há muito construído, jamais terá a mesma força. Ganha antes a força inversa, num cortante desfecho de quem julga saber amar na plenitude.
 
Um clássico tocante.
 
 
Sinopse www.wook.pt: Madame Butterfly é uma das mais trágicas e comoventes histórias de todos os tempos, um paradigma do amor à beira da loucura e da morte.
 


O Amor (Marguerite Duras)

quarta-feira, 5 de setembro de 2012


 
A leitura deste pequeno livro permite-nos chegar à velha certeza do amor: a sua incerteza. Complexo? Sim, duplamente complexo. Árduo, injusto, pesado… enfim, o que se poderá dizer do sentimento mais almejado e paralelamente mais malogrado?
É sem dúvida uma leitura sem chão, de sentimentos dispersos, mas não por isso mais leves. Eu diria, exactamente por isso, mais pesados… mais carregados de um medo impossível de definir. Medo de perda. Medo do finito. Medo de um relógio de pilhas no seu término.
Uma praia cuja água há muito não reflecte nada de novo…
 
 
Sinopse em www.wook.pt: Marguerite Duras é um dos mais significativos nomes da literatura francesa e tem colaborado estreitamente com o cinema. Títulos como «Hiroshima, Meu Amor», «Moderato Cantabile» ou «O Amante» são bem conhecidos do público português. «O Amor» é um dos textos mais enigmáticos e fascinantes das obras de Marguerite Duras.
 
 
 

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