Fim (Fernanda Torres)

quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018


Fernanda Torres é uma conceituada atriz brasileira. «Fim» é a sua estreia no mundo literário, tendo alcançado, com a presente obra, um sucesso inquestionável.
 
«Fim» retrata a história de um grupo de rapazes, agora, séniores às portas da morte. O momento reclama, pois então, reflexões por parte de todos eles: a tenra idade, as aventuras, os amores, os desamores, as mulheres, os filhos, as amantes. Uma vida repleta de vida, agora, a extinguir-se a passos largos.
 
A obra de Fernanda Torres é, a meu ver, uma ode à terceira idade. A tendência é esquecer o presente, tenha 20 ou 50 anos, e focar-se no passado, não me dirá? Digo-lhe eu que assim é. Porque o passado é quente, confortável e certo. Por já nada haver capaz de o mudar, surgem as memórias convenientes que nos fazem querer, sempre, voltar aos lugares (supostamente) felizes. É que o comboio já passou, as aventuras possíveis estagnam, surge a melancolia, a saudade, o arrependimento.
 
É nessa linha que as personagens, peculiares, de Fernanda Torres nos vêm reafirmar a importância de estarmos vivos, conscientes de um passado, amargurados muitas vezes com um presente que não presenteia ninguém, bem como munir-se das mais caricatas estratégias para chegar ao futuro.
 
Só mais um dia. Só mais uma oportunidade antes que o Parkinson, ou uma artrose, impossibilite a caminhada junto à praia. Quem diz isto, diria também, novas oportunidades para amar direito. Já que amar torto é a premissa de todos estes homens.
 
Conheça o Álvaro, o Neto, o Ciro, o Sílvio e o Ribeiro. Conheça as suas aventuras e desventuras, dignas de nota. Dignas de uma vida outrora repleta para, mais à frente, a sentirmos vazia de esperança, pelo que já foi e não volta. Pelo fim que chega.
 
Para os leitores mais empáticos, a impossibilidade destas personagens de mudar o que já foi, poderá originar-lhe dois sentimentos bem distintos: encerrar-se na amargura de nada poder fazer perante o fim iminente, ou prestar atenção aos pequenos detalhes, enquanto ainda vai a tempo.
 
 
Se deseja um livro sobre uma temática mais profunda, mas numa escrita leve, despretensiosa e cómica, «Fim» é a solução.
 
 
 
 
 
 
Boas leituras, seja feliz.
 

A Magia do Silêncio (Kankyo Tannier)

terça-feira, 27 de fevereiro de 2018


O livro "A Magia do Silêncio", de Kankyo Tannier, alerta-nos para a emergência de olharmos para dentro, priorizando a consciência e amenizando um ego cada vez mais caprichoso, que nos empurra para tudo o que implica ter, ao invés de ser.

A monge budista Kankyo Tannier, moderna, adepta das redes sociais e do diálogo, vem mostrar-nos uma abordagem integrada na importância da meditação, do silêncio e da consciência nos dias apressados de hoje.
 
Para tal, considera não só a importância do silêncio como, também, a importância de saber olhar: olhar para o que realmente tem valor. Paradoxalmente, a sua maioria não se compra com dinheiro. As questões relacionadas com o consumismo são também apontadas, como se no ato de comprar nos prometessem uma felicidade duradoura, mas tal não acontece. Já parou para pensar nos parcos minutos que uma compra, um mimo de si para si, lhe proporciona? Rapidamente surge o vazio, que reclama nova compra, uma nova forma de colmatar um vazio cujo preenchimento o reclama a si, e não a coisas. Efémeras. Passageiras.
 
Desafio-o aos exercícios propostos pela autora, ao longo de todo o livro, e mais do que isso, desafio-o a esse virar de olhos, para dentro, a serenar, a saber esperar e a, apesar do tão em voga que o termo começa a estar, ser grato. Não no sentido gasto, e da moda, no sentido genuíno: ser grato pelas pequenas coisas, que não se compram, que se conquistam.
 
 
 
 
 
Seja feliz. Por si.

Passear duas vezes

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018


O passeio com Afonso Cruz continua, e que bom que assim é.

Boas leituras,

As Virgens Suicidas (Jeffrey Eugenides)

quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018


"As Virgens Suicidas», primeira obra do conhecido autor Jeffrey Eugenides, é uma história sobre o amor, a adolescência e o suicídio.

A história centra-se nas cinco irmãs Lisbon: Cecelia, Therese, Mary, Bonnie e Lux, cada uma com personalidades bem distintas, sempre juntas num contexto familiar que se adivinha, sempre uma mera adivinhação, sombrio e austero.

A trajetória das meninas é narrada 25 anos depois das suas mortes, pelos meninos (agora homens) que seguiam de perto todas as pisadas daquelas que eram consideradas as mais bonitas da escola. Eram muitos os que pensavam como é que aqueles pais, o Professor de Matemática e a senhora sempre enfiada em casa, de cabelos baços e corpo roliço, haviam criado tais belezas.

Nas raras vezes em que um dos meninos conseguia entrar na casa dos Lisbon, iniciava-se uma odisseia pelo mundo daquelas irmãs: percorriam, durante longos minutos, a casa-de-banho na busca de algum tesouro, um batom, um tampão, cabelos loiros perdidos entre as cerdas da escova.

O livro de Jeffrey Eugenides é muito mais do que uma história sobre cinco irmãs que decidem pôr termo à vida. O excecional da sua obra passa, precisamente, pelas ilações que qualquer leitor pode retirar depois de se confrontar com um acto assustador, que pede misericórdia mas que nos compra a curiosidade e a necessidade, emergente, de julgar, questionar e apontar dedos.

Após a morte de Cecelia, um evento em especial levará a que os pais, sombrios desde sempre, se fundam numa casa que, igualmente, parece apodrecer e desintegrar-se com a força, pesada, dos dias. Há uma decrepitude na casa que espelha o estado de espírito de um pai e de uma mãe que perdem um filho.

Também a vizinhança se abala com o acontecimento. O egoísmo (ou a coragem?) dos suicídios parece ter levado as meninas, que decidiram em primeira mão os seus próprios destinos a matar igualmente um bairro inteiro, pela curiosidade e pela ausência de uma resposta.

Ao longo de todos aqueles anos persistiu, e persistirá, a dúvida: porque se mataram as meninas Lisbon? Terá sido a austeridade mascarada dos pais? Uma adolescência conturbada que, fruto de constantes reprimendas dos pais, implode em comportamentos mais levianos, de quem usará o corpo como forma de pedir amor? Lux era assim. Cecelia não se enquadrava dentro dos seus tenros 13 anos. Bonnie rezava. Mary e Therese pareciam indiferentes e ausentes.

E as questões poderiam continuar. As respostas continuariam a tardar. A nunca chegar.
Leia este livro e permita-se à dúvida, uma história que começa e termina em aberto. As dúvidas persistem sem, no entanto, deixarem de conquistar irremediavelmente o leitor, pela carga e pela amargura de um tema que nunca deixará de nos sensibilizar.



Boas leituras,

Boneca de Luxo (Truman Capote)

domingo, 18 de fevereiro de 2018


«Boneca de Luxo», um dos livros (novelas) mais conhecidos de Truman Capote, adaptado ao cinema no ano de 1961, com a célebre Audrey Hepburn, foi uma das minhas mais recentes leituras.
Esta é a história de Holly, mulher envolta em mistério e encantamento.
Tudo começa com um narrador presente, a contar-nos as constantes interrupções desta mulher para que lhe abram a porta do prédio. Esquece sempre a chave e, após incomodar, continua a lidar com os vizinhos como se nada fosse, porém, sempre com doses de ternura e simpatia acrescidas.
Através das deambulações do nosso narrador, um escritor fracassado, vamos conhecendo as particularidades de uma mulher que insiste em esconder-se bem, semeando paixões e amores deslocados por onde passa.
Também não serei eu a contar-lhe os segredos de Holly.
Leia a sua história em primeira mão, conheça os segredos de uma mulher especial, que vende suspiros e compra paixões; uma acompanhante de luxo que guarda em si uma espécie de criança grande, com sonhos díspares de uma realidade em nada cor-de-rosa.
 
 
Boas leituras,

Ler(-te)

quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018


Não pica. Não dói.
 
 
Seja feliz,

Pão com Fiambre (Charles Bukowski)

terça-feira, 13 de fevereiro de 2018

 «Pão com Fiambre», de Charles Bukowski, é um livro parcialmente autobiográfico, considerado um dos melhores do autor, ou mesmo o melhor de todos.
 
O livro conta-nos a história de Henry Chinaski (famoso alter ego de Bukowski), as suas amarguras enquanto criança, jovem e homem inadaptado. Viveremos a sua incapacidade de se integrar no ciclo de amigos na escola primária, à entrada de uma adolescência rica em borbulhas e isolamento consequente, a um pai que castiga de cinto na mão, dia sim, dia, e uma mãe incapaz, submissa e lacrimosa.
 
O cenário está criado e vem mostrar-nos a solidão, amargura e impotência de uma criança que cresce na sombra de discussões, do desemprego, das carências ditadas pela Grande Depressão.
Também numa depressão profunda encontramos este menino que, aos poucos, cresce para fora, somando-se as questões tão legítimas como ser feliz, amado e integrado. Contudo, parece que nada destas simples ambições ao mais comum mortal, lhe pertencem.
 
"Levantei-me e saí. Dirigi-me para casa. Então, é isso que eles querem: mentiras. Mentiras bonitas. É disso que precisam. As pessoas eram ridículas (...)."
 
Cada tentativa lhe sai rogada até ao momento em que o cansaço e a indiferença começam a imperar: ele é o jovem com um característico sorriso de desdém, desdém esse que ultrapassa o esforço de quem já não quer saber. A intolerância a si mesmo, e aos outros, imprimem-lhe a necessidade quente de um refúgio: surge assim o amor inexplicável, e gigantesco, pelo mundo dos livros e da escrita.
 
Será também a escrita a ditar-lhe um rumo diferente, inesperado, empurrando-o para uma vida ainda embrionária, sem livro de instruções que lhe valesse. O mundo espera por Henry, mas ele não espera ninguém.
 
Através de uma vida em constante abandono, Bukowski mostra-nos, implacável como sempre, o abismo de uma vida sem amarras, com um jovem que se procura a si mesmo entre o desespero de uma família em ruínas e o poço da Grande Depressão.
 
Magnífico.




Uma leitura com o apoio:



Sejam felizes,

Running into yourself

segunda-feira, 12 de fevereiro de 2018


"No matter where you run,
you just end up running into yourself."
 
Breakfast at Tiffany's (Truman Capote)
 
Em breve conto-lhe mais sobre a inesquecível Holly.
 
Seja feliz,

Adeus, até amanhã (William Maxwell)

sábado, 10 de fevereiro de 2018


William Maxwell, conceituado escritor americano, é o autor do livro tido como o "pequeno romance perfeito", pelo Washington Post Book World. Trabalhou com autores igualmente notáveis como, por exemplo, Vladimir Nobokov e John Updike.
 
Neste pequeno romance perfeito, Maxwell empurra-nos para uma história em que a amizade, o passado, o arrependimento e a nostalgia são pontos assentes e que, somados e misturados, se transformam numa história sem fim, em aberto, como os arrependimentos escuros que nos habitam como nódoas.
 
Em «Adeus, até amanhã», encontraremos um narrador sem nome, a percorrer sem freio o passado e o presente na angústia de quem perdeu oportunidades. Uma perda seca, desamparada, o momento chave do é ou não é. Não foi, e por muito fragmentado que fosse o tempo dessa oportunidade, o arrependimento dessa não ação, dessa timidez de púbere, ditaria assim a nostalgia a vincar-lhe os dias pela vida fora.
 
Tudo começa com um crime, ao que dizem, passional.
A amizade entre duas crianças será, posteriormente, colocada em causa quando percebemos que uma dessas crianças é filho do agressor, este, também morto depois pela própria mão.

O crime, o mistério em seu torno, a curiosidade infantil sobre as motivações, os amores apêndices, desajustados e direcionados para quem não seria suposto, criará uma atmosfera de dúvida, incerteza e afastamento.

O amigo, e nosso narrador detalhado, enfrentará ao longo dos anos a mágoa de não se ter dirigido ao amigo, restando apenas as questões que se viraram para dentro. Um grande "e se".

Com base num único acontecimento - um crime - William Maxwell consegue-nos fazer chegar em catadupa um mar de questões que surgem, unicamente, a partir do coração de uma criança atormentada.

Um livro magnífico a comprovar que a simplicidade de uma história a poderá tornar, para sempre, um peso pesado, à semelhança das entranhas emaranhadas de que só o arrependimento é feito.
Para ler e reler.



Boas leituras,

Paula (Isabel Allende)

quarta-feira, 7 de fevereiro de 2018


«Paula» de Isabel Allende é um livro que contém em si toda a sensibilidade do mundo. Acredite, quando falamos da morte, dessa pessoa que parece ficar mas que, irremediavelmente, tem de ir, exige essa nudez de emoções, uma catarse necessária para afastar demónios e encarar a verdade, tal como ela se nos apresenta.
Um livro que é uma espécie de carta emocionada que a autora escreve no momento em que a sua filha padece de uma grave doença que a levará à morte. Uma morte lenta, um coma que não dá alento, uma esperança que teima em ficar de mão dada ao medo incomparável da morte. Sempre fria. Traiçoeira. Estúpida.
Ao longo do livro o leitor terá a oportunidade de conhecer a história da família Allende, as confissões por vezes baralhadas de uma mãe que, na iminência da perda, faz uso da escrita como forma de superar o desamparo que todos aqueles meses lhe imprimem na alma.
É através dessa escrita apaixonada, desordenada e aflita, que a autora nos revela mais de si, da família, dos filhos, dos amores, dos desamores, de si enquanto mulher apaixonada por todas as formas da vida.
Um livro tocante em que até à última página lhe suscitará a esperança de que Paula fique. De que não continue fechada em si mesma, o olhar vago e perdido de quem encontrou, afinal, uma outra direção. Tão oposta.
A vida é assim, dizem. Tem de primar pelo fim, na esperança de que lhe atribuam toda a esperança antes dessa chegada iminente que tudo termina, que tudo muda, que tudo desnorteia. É precisamente esse aldrabar de um fim que obrigaram a autora a escrever sem parar: uma emergência de quem desespera por dizer tudo o que não disse, colmatar ausências e culpas que sempre surgem no lado mais sombrio dos dias.
 
Se é feito de um coração frágil, leia este livro.
Se é feito de um coração que não oscila, leia este livro.
 
Um daqueles livros que comprovam que o amor, a perda, o luto, a morte e a resiliência, são obrigatoriedades para todos nós. Para refletir. Para amar mais e melhor. Para deixar ir, quando a vida assim o diz.
 
Um livro admirável e que, obviamente, só posso recomendar.
 
Boas leituras,

Para leitores convencidos

terça-feira, 6 de fevereiro de 2018


 
Seja feliz,
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