O Casal Fiel (A.D. Miller)

quarta-feira, 26 de junho de 2019


A primeira vez que vi este livro, já há uns anos, fez-me especular sobre uma série de possibilidades sobre qual seria, de facto, o verdadeiro tema. O resumo parecia-me dúbio, descarado, como quem nos quer vender uma história mascarada de outra. Pois bem, comprou-me a atenção e fez-me questionar, e quase a certificar-me de estar certa, de que se trataria de uma história de amor entre dois homens. Não satisfeita, refiz as minhas teorias e considerei, afinal, que poderia estar perante um drama amoroso de uma mulher indecisa entre dois homens.
 
Estava tão longe, caro leitor, tão longe de saber o que me aguardaria nesta história.
 
De facto, o livro fala-nos de dois homens, Adam e Neil. Fala-nos também de uma rapariga, Rose, que irá aparecer um pouco mais à frente no decorrer das suas vidas. Ficará, para sempre, entrelaçada na vida daqueles dois. Será um romance? Será uma tragédia? Não lhe digo.
 
A amizade de Adam e Neil surge de uma forma inesperada e quase irreal. Entre jovens estudantes, numa festa, conhecem-se, conversam e decidem, sem grandes modéstias, continuarem a sua viagem juntos em direção à Califórnia. Daí se solidificará uma amizade que nasceu, literalmente, do nada. As suas vidas, na mesma medida, em nada ficarão iguais depois do peso que essa amizade tomará na vida de cada um.
 
"Neil não era cool, mas não se parecia importar, o que era por si só uma espécie de atitude cool; a indiferença dele tinha um poder negativo muito próprio."

A.D. Miller escreve uma história sobre uma amizade toldada por um segredo, mútuo, mas construído sobre duas diferentes perspetivas, que não só abalará como determinará as suas vidas dali para a frente.
"Não contar ao amigo talvez fosse mais bondade que mentira. Na prática, frisava Adam para consigo, a traição seria apenas acionada caso Neil descobrisse. Ele podia viver sem saber isto; estava a viver plenamente feliz. Estava a viver tão feliz."
 
Acredite em mim que este livro não o irá desiludir, pelo menos, eu acredito e aposto nessa ideia convictamente. O motivo incide na temática, magistralmente construída por Miller: a moralidade. Esse é o tema central de «O Casal Fiel». Aquelas velhas ideias vincadas do moralmente correto, a linha fina que divide o certo do errado, a vida que deverá ser delineada apenas e só a preto e branco. Será mesmo assim? É claro que não. A vida é um conjunto mesclado de tons duvidosos, discernir alguma clareza talvez seja, diga-me você também, um dos nossos grandes propósitos.
 
A.D. Miller vem assim acutilar o nosso descanso mental para com uma história (aparentemente) simples, nos invocar demónios antigos, estabelecer fronteiras entre o tal certo e errado, provocar-nos uma decisão, apelar por um ou outro personagem, destacar perspetivas, enfatizar umas, desprezar outras. Será assim: um verdadeiro carrossel de ideias, moralmente (in)corretas levadas por essa corrente de complexidade humana que, à força toda, precisa de uma teoria preto no branco, que lhe apazigue anos de culpas, de ausências, de palavras que nunca se disseram.
 
Se esta história acaba bem? Também não lhe posso contar.
Poderá rogar-me todas as pragas que desejar mas, acredite mais uma vez, valerá a pena esta curiosidade que lhe estou a vender de cara lavada. Aliás, toda esta curiosidade que lhe imprimo aqui é apenas um pequeno prelúdio a uma história que merece toda a sua atenção.
 
 ❤
"É engraçado, não é, que comecemos sem querer coisa nenhuma uns dos outros, e é quase esse o cerne da questão, a liberdade que tínhamos, e depois queremos mesmo coisas e ficamos felizes em as dar, o tempo e tudo o resto. E então descobrimos que há certas coisas que custam demasiado a dar ou ás vezes a aceitar."
 

Seja feliz,

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