Todas as almas (Javier Marías)

segunda-feira, 25 de maio de 2020


Em «Todas as almas», Javier Marías empurra-nos para uma história contada por um homem sem nome. E não é por acaso que isso acontece. Pondera-se a possibilidade do romance ser autobiográfico. As notas finais do autor (Conferência lida a 7 de Novembro de 1989 no âmbito do seminário A Personagem romanesca, em Madrid.) apontam para um não. Ainda assim, o leitor tem um espaço feliz para duvidar das palavras do autor. Bem ao seu jeito irrepreensível de quem conta, sem contar.

São muitas as definições que podemos encontrar para a palavra «alma». De todas elas, escolhi esta: "Pedaço de sola que fortalece o enfranque do calçado». Mais tarde, explico-lhe o porquê.

Aqui se escreve sobre um professor espanhol, sem nome, durante a sua estadia académica na cidade de Oxford. Perdido numa espécie de vida nova, com pessoas novas e a necessidade de um encaixe que se impõe, vamos acompanhando os seus passos tímidos naqueles que serão dois dos anos mais marcantes da sua vida.

Todo o livro parece ser criado na sombra da solidão deste homem e nos esforços para lhe fugir, mesmo que subtilmente. Conhecerá a jovem professora Clare Bayes, casada, e com quem manterá um romance secreto.
A narrativa acontece muito depois do professor ter estado em Oxford. Agora é casado e pai de um filho ainda pequeno. Serão as reminiscências em torno daquele lugar e da aventura proibida que o fará entrar num rodopio de pensamentos sobre si mesmo, sobre Clare naquele passado, sobre a vida, sobre os autores que estudou e, acima de tudo, sobre todos aqueles com quem travou contacto, a maioria, já falecidos.

Esta é uma história feita de reminiscências, como quem precisa de voltar a um passado particular para engrandecer as perspectivas do presente que agora vive, a exigência da responsabilidade de ser pai. É também uma história de pessoas perdidas, a solidão como ponto comum e o amor como destino sonhado. A certeza de que todas as almas aspiram ao mesmo acalma e conforta, tal e qual como o pedaço de sola que fortalece o enfranque de um sapato.
Há lugares comuns ao desamparo e é a certeza de não estarmos sós que nos sustenta a alma agitada e perdida naquilo que foi e, muito provavelmente, não voltará.

Com o apoio:
 
Pedaço de sola que fortalece o enfranque do calçado.

"alma", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2020, https://dicionario.priberam.org/alma [consultado em 24-05-2020

Seja feliz,

1 comentário:

Landa disse...

Nunca li nada de Javier Marias, tenho mesmo muita curiosidade. Parece um livro interessante. Boas leituras

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