"Proibido", do jornalista António Costa Santos, é um livro centrado no Estado Novo, regime político em nada desconhecido por todos nós, mesmo para aqueles que não o tenham vivido na pele, como é o meu caso.
De apenas proibido no título, este livro é uma obrigatoriedade na estante de qualquer português que ouse recordar uma época tão amarga e que proclama questionamento, como o autor mesmo refere: "Como fomos capazes de sobreviver?".
Através de uma estrutura exemplar, vamos acompanhando uma série de ridículas proibições, muitas delas classicamente conhecidas mas que, no entanto, mesmo conhecendo eu a maioria delas, não deixei de aprender uma série de ampliações dessas mesmas proibições. Por exemplo, na tão conhecida proibição da minissaia ou dos centímetros certos a usar nas saias das meninas e senhoras, desconhecia uma "lei" quanto a combinações de cores, onde preto e vermelho ou preto e laranja eram tidas como provocadoras aos olhos dos homens.
Através de uma estrutura exemplar, vamos acompanhando uma série de ridículas proibições, muitas delas classicamente conhecidas mas que, no entanto, mesmo conhecendo eu a maioria delas, não deixei de aprender uma série de ampliações dessas mesmas proibições. Por exemplo, na tão conhecida proibição da minissaia ou dos centímetros certos a usar nas saias das meninas e senhoras, desconhecia uma "lei" quanto a combinações de cores, onde preto e vermelho ou preto e laranja eram tidas como provocadoras aos olhos dos homens.
Imaginem um mundo em que a leitura dos livros era restrita, e vigiada atentamente. Um dos aspetos mais interessantes foi saber da existência de estantes com fundo falso nos pisos inferiores das livrarias: "(...) onde eram guardados, logo à chegada, os livros que o experiente livreiro sabia estarem na mira da ditadura." (p.25)
Muitas vezes a revisão dos livros era feita num "só porque sim" irritante de quem manda.
Confesso que a presente proibição é a das que, pessoalmente, me agita mais. Pelos reais motivos em que tudo decorre: "(...) Lembra Paulo, no capítulo 11 dessa carta, que, tal como o pão simboliza o corpo de Cristo e o vinho o seu sangue, a cabeça simboliza uma hierarquia estabelecida que desce de Deus para Cristo, de Cristo para o homem e do homem para a mulher. Deus é a cabeça de Cristo; Cristo é a cabeça do homem; e o homem é a cabeça da mulher. Nesta passagem, cabeça significa fonte de autoridade e não de superioridade, apressam-se a explicar os especialista do cristianismo, não se livrando contudo de verem o princípio classificado de machista (e bem! - isto sou eu que digo!)
Segundo a Bíblia, Deus e Cristo são iguais, são um, mas, como homem, Jesus provém de Deus e é nesse sentido que Deus é cabeça de Cristo. Ora, o Génesis afirma que a mulher deriva do homem, mais propriamente de uma costela de Adão. Logo, o homem é a cabeça da mulher.
E Paulo explica que o homem não deve cobrir a cabeça por ser «a imagem e a glória de Deus» e não é apropriado que a glória de Deus se apresente com boné perante Ele. (...)
Pela mesma razão, a mulher deve cobrir os cabelos por ser a «glória do homem». Se na ordem da criação ela é subordinada do homem, esta hierarquia também deve ser reconhecida na igreja e manifestada através do véu que a mulher usa sobre a cabeça." (p.52)
Não. Não vou tecer qualquer comentário além do aqui transcrito. O silêncio, por vezes, é indicador de uma superioridade muito maior do que qualquer palavra. Dita ou escrita. (O meu silêncio está a rir-se)
Outra clássica. E muito frequente. Sempre de vigia, à espera de uma falha, atentos ao pormenor de uma iminente distração de quem quer viver um pouco. Biquíni de uma peça só. E nada de umbigos à vista!
O autor do livro conta uma história deveras caricata ocorrida naquele tempo: "(...) a história de uma inglesa que, interpelada por um polícia marítimo, no sentido de cobrir a barriga, aos gritos de «just one piece", uma peça, fato-de-banho só de uma peça, nada cá de sutiã e cuecas, terá entendido menos bem o inglês da autoridade e tirou a parte de cima do biquíni. "Se é só uma peça, fico com a de baixo, OK?"
E por último, uma igualmente clássica mas que não posso deixar de a referir. Tanto pudor, e se eventualmente a paixão entre duas pessoas resvalasse um pouco, terminando num tímido beijo, poderia acabar em prisão: "Levado para a esquadra, ou para o posto da GNR, o delinquente hétero-beijoqueiro era identificado, autuado em pelo menos 57 escudos (...) e passava invariavelmente pela cadeira agente-graduado-em-barbeiro, de onde saía de cabeça rapada, máquina zero." (p.117)
Caso para dizer, beijos que saíam (muito) caro.
Entre estes, outros sinais de «proibido» fazem parte deste pequeno e interessante livro, deixando muito para pensar.
Desde a famosa proibição dos isqueiros, às coca-colas e ao simples ato de sacudir o pó à janela, encontramos uma série de pequenas e grandes proibições, muitas delas coladas na mente e nos costumes lusitanos, mesmo quando essas referidas leis não o são realmente.
Mas diz-se que é proibido.
E não se fala mais nisso.
Uma leitura que recomendo vivamente.
Boas leituras!
2 comentários:
Por norma não costumo ler romances de jornalistas: Rodrigues dos Santos, Sousa Tavares, etc. Abri uma exceção para as obras históricas de João Aguiar, mas fiquei na dúvida se este livro era um romance ou um documento histórico, o que é diferente.
Não, não é romance :)
Também não tenho esse costume, de ler romances de jornalistas apesar de agora, curiosamente, estar a ler Miguel Sousa Tavares (estreia!).
Este livro de António Costa Santos é baseado numa pesquisa cuidada daquele tempo e das proibições mais genéricas às mais específicas, regulamentadas por Lei e outras... nem por isso.
Vale muito a pena.
Boas leituras!
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