A Morgadinha dos Canaviais (Júlio Dinis)

sábado, 26 de março de 2016


Júlio Dinis era, afinal, Joaquim Guilherme Gomes Coelho. Nasceu no Porto em 1839, formou-se em Medicina, mas não chegou a exercer porque a tuberculose obrigou-o a desistir da profissão e a abandonar a cidade. Em Ovar, terra natal do seu pai (a mãe era de origem inglesa), encontrou tempo para se dedicar à literatura e escrever As Pupilas do Senhor Reitor, o seu primeiro romance. Logo que se sentia restabelecido regressava à cidade e aos seus afazeres profissionais, mas a doença não lhe dava tréguas e volta e meia via-se forçado a refugiar-se no campo. Faleceu no Porto em 1871 vítima de tuberculose. Tinha apenas 32 anos. Apesar de jovem, deixou-nos uma importante e vasta obra, na qual encontramos A Morgadinha dos Canaviais, Os Fidalgos da Casa Mourisca, Serões da Província e Uma Família Inglesa (o único dos seus romances que não tem por cenário o meio rural).
 
 

«A Morgadinha dos Canaviais» dá-nos a conhecer a história de Madalena, das suas gentes do Minho e das muitas aventuras a que estas personagens estariam guardadas.
Apesar da narrativa se centrar na morgadinha - Madalena - e que a esse nome se vinculou pela sua madrinha, «A Morgada dos Canaviais», esta singela história de Júlio Dinis começa com a não menos inesquecível personagem de Henrique de Souselas, hipocondríaco citadino que apenas na cidade vê os vislumbres da vida e a aldeia, essa, um manto de inatividade e atraso decadentes. Contudo, um dia em que as suas muitas doenças parecem agravar a passos largos, segue desesperado os passos de um médico que lhe aconselha os ares do campo.
Começa uma viagem em direção ao campo, para a casa da tia Doroteia, cuja morgadinha seria referida inúmeras vezes, na mesma medida em que o espanto e a admiração dos populares competia com o despeito e irritação de Henrique.
 
 
 
Dá-se início ao grande motor desta história de Júlio Dinis: o amor não correspondido de Henrique pela Morgadinha dos Canaviais, mulher de fortes ideais, de forte caráter e de coração no lugar certo.
 
Uma história leve que tal como Eça referiu sobre o autor "viveu de leve, escreveu de leve, morreu de leve", mas ainda assim, neste pequeno enredo o leitor terá o privilégio de se confrontar com personagens verdadeiramente inesquecíveis.
Augusto, o rival de Henrique, que por ser pobre, mas uma distinta inteligência e nobreza, afunda os sentimentos de adoração à morgadinha. Cristina, prima daquela, apaixonada por Henrique, e que não se sabendo correspondida viverá enormes ciúmes de sua prima.
 
E depois, depois há tantos outros!
Vicente, o herbanário com uma aura de vidente que tudo parece saber sem procurar. O Conselheiro, pai de morgadinha a representar o vínculo amargo que Dinis pretende também invocar na sua obra quanto à escuridão da política e os seus amargos de boca. Ermelinda e Ângelo, um amor destronado por uma madrinha tão devota quanto castradora, invocando agora a religião, na minha opinião, sublimemente bem feita pelo autor.
 
Outros temas poderão ser invocados e penso que é precisamente o ponto que gostaria de frisar nesta obra que vos trago hoje: Júlio Dinis pode, segundo Eça, (e tantos outros!) ter vivido e escrito de leve, mas quem lê «A Morgadinha dos Canaviais» tem a oportunidade de extrair desta crónica da aldeia camadas infinitas de pequenas grandes lições de vida. Leves ou não, ficarão na consideração do leitor...
 
De um amor arrebatador que se julga inultrapassável, à dor de uma injusta calúnia, aos mal entendidos que levam a resoluções infundadas, aos amores mal colocados, aos preconceitos sociais e ao ciúme desmedido, tudo parece ter a solução ideal quando na mesa se coloca o peso certo de quem fala a verdade, sem falsa modéstia ou pudor.
E nesta história, a última palavra pertencerá, para sempre, à Morgadinha dos Canaviais.
 
 
Muito bom.
Recomendo.
 
Termina, assim, a terceira etapa deste meu desafio pessoal.
Venham mais! Boas leituras.

2 comentários:

Su disse...

Olá, Denise :D
Convenceste-me, tenho de ler. Por acaso a "senhora minha mãe" (de quem herdei a compulsão da leitura) fala muito bem do escritor, mas folhei só o "Uma família inglesa" e na altura não me captou a atenção.

beijinhos e boas leituras

Denise disse...

Olá Su!

Fico contente. Este meu desafio tem sido muito bom para me alertar quanto à importância da literatura portuguesa. Quantas maravilhas temos para desbravar :)
Quanto ao livro que falas sei que é um dos mais densos do autor...
Tenta a morgadinha, acho que não te vai desiludir!

Beijinhos e boas leituras!

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