A Cidade das Mulheres (Elizabeth Gilbert)

terça-feira, 24 de novembro de 2020

«A Cidade das Mulheres» foi a minha estreia com a obra da autora Elizabeth Gilbert. Apesar de muito conhecida com o seu célebre «Comer, Amar, Orar», parti, ainda assim, com expectativas pouco elevadas. A verdade, porém, é que o livro aumentou e superou qualquer expectativa que pudesse ter a seu respeito.

Gilbert escreveu um livro para todas as mulheres e para todos os homens, porque também estes precisam de alargar a sua consciência quando o tema é a mulher na sua plenitude e, mais ainda, quando o assunto recai também no conceito de «feminilidade».

Esta é a história da jovem Vivian, 19 anos, rebelde e longe de, ao contrário dos seus pais conservadores, desejar uma vida pautada pelas regras impostas por uma sociedade passada a ferro, sem mácula de qualquer ordem.

Por não se adequar à universidade, escapando sempre que podia, os pais decidem enviá-la para Nova Iorque, para junto da tia Peg, que coordena e gere o teatro precário «Lily Playhouse».

Vivian aprendeu desde pequena a costurar com a avó. Não só uma habilidade importante como um dos seus grandes interesses e qualidades. Será nessa premissa que começará a dar os primeiros passos no teatro da tia Peg, a ganhar um lugar e o sentimento de pertença, pela primeira vez na vida.

A par de tudo isso, estamos nos anos 40 em Nova Iorque. É toda uma nova vida que desponta, amizades que nascem no seio do teatro e Celia, a corista mais bonita que alguma vez viu, iniciará a jovem Vivian a um mundo de muitos amores, folia, glamour, sexo e alcool.

"A juventude é um tesouro insubstituível, e a única coisa respeitável a fazer com um tesouro insubstituível é desperdiçá-lo. Por isso, faça o melhor com a sua juventude, Vivian... esbanje-a."

É quase como viver num carrossel. A energia e juventude de Vivian parecem não cessar. Descobre um mundo novo, uma cidade que depressa fez sua e um encantamento crescente de quem ainda se sente quase infantil. Ela descobrir-se-á como mulher e como pessoa, através de um despontar de uma sexualidade muito forte. Conhecerá o primeiro amor, e como a maioria, o seu fatídico fim. 

O livro pode facilmente ser dividido em dois momentos. O primeiro que descreve a sua chegada a NY e todo o manancial de novas experiências e, depois, fruto da inconsequência da idade, um pequeno grande mal entendido fará com que a vida da jovem jamais volte a ser a mesma.

Nesse caminho chega também a II Guerra Mundial. Vivian nos seus tenros anos vive um conjunto de fortes experiências, não indicadas para corações mais fracos. Mas se há coisa que não se verifica nesta mulher, é um coração fraco.

É um livro sobre a vida, sobre o papel da mulher sempre tão prontamente enquadrado em moldes esperados. A sexualidade vista sem pudores na perspectiva feminina. É um livro em que também nos faz pensar sobre o julgamento fácil, a presunção da sociedade que facilmente cataloga uma mulher como "putinha sem vergonha" porque vive a sua sexualidade como tão bem entende.

É um abrir de olhos, também, às consequências de se ver o mundo/ a sociedade/ as escolhas das pessoas como taxativas, como uma conta certa de matemática. Se te dás a mais do que a um homem, serás uma puta. Se gostas de te divertir, serás sempre uma cabeça de vento e a vida encarregar-se-á de te puxar as rédeas com o castigo certo na ponta do travão. 

Mas será mesmo assim?

Vivian é o reflexo de um tempo, de uma época, mas também de um marco que se estenderá ao presente e ao futuro. Esta mulher decidiu simplesmente viver a vida ao sabor da sua única e exclusiva vontade. Errou e do erro gerou as suas próprias leis, por onde sempre se governou. 

"A Cidade das mulheres" é um livro sobre mulheres, sim, mas é igualmente uma história que imprime aquela necessidade de relembrar, vezes sem conta, que somos sempre nós os responsáveis das nossas próprias escolhas. Dar, de olhos fechados, o nosso próprio livre arbítrio aos outros, é o equivalente a comprar dores alheias e fazê-las nossas. Nessa perspectiva, sejamos capazes de assumirmos quem realmente somos. Haverá sempre quem condene, quem idolatre, mas no fim, só conta o que fica em nós.

O amor verdadeiro que Vivian encontra quando menos espera é a prova que nada é o que parece e uma pessoa será sempre esse campo de batalha solitário. Não há vozes de burro que cheguem ao céu, já deveríamos saber.


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