O mantra dos dias de hoje

sábado, 30 de janeiro de 2021

  

 Dentro do possível, faça por ser feliz.


As horas nuas (Lygia Fagundes Telles)

segunda-feira, 25 de janeiro de 2021

Lygia Fagundes Telles é das autoras brasileiras mais conceituadas. Os seus romances são, acima de tudo, de aprendizagem em que os iniciandos são mulheres (Regina Louro). Se em «Ciranda de Pedra» acompanhamos a história de uma menina em formação, em «As horas nuas», lê-se a história de uma atriz famosa, Rosa Ambrósio, agora, confrontada com o envelhecimento, fim da carreira e consequente crise existencial. A história vai oscilando entre passado, presente e anseios do futuro. A sua vida é analisada por Rahul, o seu gato. E se a visão de Rosa Ambrósio, a nossa atriz, parece toldada pela bebida, o gato consegue vê-la muito bem. E que gato este. 

Todas as personagens desta história parecem ter um traço comum, traço esse que as une pela ideia de desamparo. De alguma maneira, mais ou menos evidente, cada uma das pessoas que circula na vida de Rosa Ambrósio parece perdida em si mesma, como se a vida que lhes tivesse passado por cima antes que tivessem acordado, calçado os sapatos e corressem atrás dela.

A sensação de desamparo, e algum dramatismo, é vivido ainda mais na pessoa de Rosa, atriz com um ego que transcende a linha do aceitável e que à laia de já não ter a atenção que tanto gostaria, inventa dores, lamentos e mergulha bem fundo num passado que o leitor, só mais tarde, perceberá como a raiz de todas as incertezas desta mulher.

Nada lhe parece ter corrido como verdadeiramente desejado, à exceção, talvez, da fama que conquistou. Rogério, marido falecido, era a jóia que a estimava. Mas Diogo era o amante que a fazia relembrar o primo Miguel. E que, de um momento para o outro deixa de aparecer. A vida da atriz começa a ser comandada pela espera e esperança do seu retorno. Cordélia é a fiel empregada que lhe ouve os lamentos e a ajuda a minimizar as vergonhas de ser velho e de não conseguir mover as pernas quando quer.

Depois, a filha Cordélia só a enche de ralações. A jovem formosa só gosta de homens mais velhos, pouco interessantes de cabeça e, pior ainda, de corpo. Diz ela que gosta de lhes dar prazer, e quase desmaia nesses anseios. 

Rosa Ambrósio não sabe o que fazer da vida num ponto em que parece impossível voltar atrás. Quem a ouve, atentamente e quase sem voz, é Ananta, a sua psicóloga. Também ela parece feita de pó e de um desamparo que, por sua vez, parece palpável. Uma mulher jovem, bonita, com cara de virgem, ainda assim. Como pode?

É assim este livro de Lygia Fagundes Telles. Há a ideia constante de uma insegurança transversal a todas as personagens, personagens essas que são quase os alicerces de um teatro cuja personagem principal é a estimada e inesquecível Rosa. O peso e a amargura desta mulher é tão grande, tão avassalador, que na dor, parece levar todas as pessoas com ela. Como lhe disse, um desamparo sem fim, como quem faz perguntas sabendo, de antemão, que as respostas nunca chegarão ou, tão pouco, satisfarão. 

Esta é também uma história de segredos e de sombras. As personagens desaparecem sem deixar rasto e nesse paralelismo surge Rahul, o gato atento e que sabe tudo o que se passa, melhor do que ninguém.

💖

Mais do que uma história sobre o peso do envelhecimento mal digerido, esta é a história de vida de uma mulher que foi bafejada por uma dor adolescente que lhe tolheu, à partida, a condição de uma vida plenamente feliz. Sabe aqueles momentos da vida, derradeiros, que ora pendem para o lado mau ou para o lado bom, definindo o futuro que se aproxima já nas próximas horas? Assim foi com Rosa Ambrósio mas esse momento pendeu, dramaticamente, para uma negatividade que quase a protegeu a vida toda, uma quase vitimização de quem não supera o passado, mal tolera o presente e confronta o futuro zangada e desprovida de esperança.

À medida dos pensamentos desordenados da personagem, o leitor acompanhará o seu percurso de vida e vai percebendo, com a ajuda de um gato atento e muito perspicaz, o quanto somos feitos de uma soma de dias pesados e do esforço comum a transmutá-los, tornando a vida um pouco mais leve, mais suportável, mais merecedora. 

 

Gostei imenso deste livro, o segundo que leio da autora e, obviamente, pretendo conhecer mais. Aliás, há já um livro da autora que está na lista para comprar e que é o seu «As meninas». Já leu? Conhece a obra da Lygia? O que me diz a respeito?

 

Boas leituras e seja feliz,

Leitura do momento

sábado, 23 de janeiro de 2021

Thomas Mann tem sido a minha companhia nestes dias. Estou a gostar muito deste livro. Acredito que, à semelhança de «A Montanha Mágica», se tornará um daqueles livros que ficam para sempre.

E desse lado? Quem gosta de Thomas Mann?


Boas leituras. Sábado feliz!

 

Seja feliz,

A letra encarnada (Nathaniel Hawthrone)

sexta-feira, 22 de janeiro de 2021

Não poderia ter começado o ano de 2021 em melhor companhia. Sempre gostei muito de clássicos e creio que sejam poucos aqueles que me tenham desiludido. «A Letra Encarnada» foi mais uma feliz descoberta, já anotada há muitos anos. Enfim, continuo com a máxima de que para tudo na vida, há um tempo certo, concorda?

«A Letra Encarnada», de Nathaniel Hawthrone, é considerado o grande clássico da literatura americana. Nesta edição, em particular, temos acesso a um prefácio muito bem conduzido por António Lobo Antunes, que não só nos dá uma visão global da obra e sua relevância como, também, larga algumas curiosidades sobre o autor e sobre a época. Sobre Hawthrone, Lobo Antunes refere: "Apesar de, no fundo da alma, Hawthrone ser um moralista severo, é capaz de flagelar com arrebatamento e severidade essa parte de si mesmo, na auto-crítica a que procedeu toda a sua vida."

No capítulo introdutório, de título «A Alfândega», o leitor terá a oportunidade de conhecer a origem que deu inspiração ao autor para escrever este livro. Nesse estabelecimento onde chegou a trabalhar, Hawthrone explica que lá encontrou um pequeno pacote com uma letra «A» já gasta e ricamente bordada em fios dourados. Juntamente com o pacote, havia um documento que relatava a história desta mulher, hoje de nome Hester Prynne, condenada a usar aquele símbolo na sua roupa por ter cometido adultério.

A história decorre entre os anos de 1642 a 1649, em Salem, Massachussets. Esta era uma época em que o Puritanismo era defendido por aqueles que tinham migrado da Inglaterra de forma a encontrarem um lugar cujas convicções religiosas pudessem ser, fortemente, postas em prática. O livro centra-se na vida de Hester Prynne, uma mulher inglesa que será enviada pelo seu marido, Roger Chillingworth, para aquela cidade, antes da chegada deste. Contudo, dois anos após ter chegado, Hester aparece grávida, e com isto, a prova para todos os presentes de estarem perante uma mulher pecadora que cometera adultério. Esta é a grande premissa da história, assim como a negação da mulher em confirmar o pai do seu bebé. Para juntar a toda esta incredulidade, em praça pública será condenada e terá de usar a letra «A» (de adúltera) na sua roupa, enfrentando a fúria dos habitantes e todas as proezas morais que se possam imaginar.

Este grande clássico da literatura gira em torno de uma análise profunda da condição e identidade feminina numa sociedade puritana. A par da condenação, esta mulher verá também surgir o seu marido, tido como morto num naufrágio e que, sem dó nem piedade, lhe lança mais um castigo: ela não poderá desvendar a sua identidade pela vergonha que lhe suscita e, igualmente, pelo desejo de se vingar. Este homem dedicará a vida a tentar encontrar o homem com quem Hester se relacionou. Este, sendo um médico e sem família, irá viver para casa do pastor Dimmesdale, uma figura ilustre e adorada por toda a comunidade. Será nesta relação que cresce a necessidade de uma vingança muito própria por parte do médico que, atento, começa a perceber no pastor um comportamento suspeito, sempre de mão no coração, faces pálidas e com uma saúde em derradeiro declínio. A pressão psicológica sustentada por este médico é de tal forma intensa que acaba por definir, igualmente, o puritanismo que o autor tanto sublinha.

Não estarei com rodeios. Nathaniel Hawthrone criou uma obra cujo tema nos remete aos problemas, infelizmente ainda atuais, sobre a condição da mulher numa sociedade altamente regida por valores masculinos patriarcais.  Nessa sequência, toda a premissa da história se centra em Hester, quase como mulher selvagem, na filha Pearl, quase uma divindade sobrenatural protegendo a dor da mãe, e na construção da identidade feminina individual e social. Este é um livro de profundas reflexões sobre o papel da mulher numa sociedade que parece não lhe guardar lugar, a não ser, num canto escuro mas com uma luz vermelha, e constante, que a relembre do quanto é pecadora. O adultério é tido como um crime que revela, precisamente, aquilo que a sociedade de Salem mais desprezava face à moralidade, à sexualidade e à liberdade dos padres.

Hester é uma verdadeira heroína. Ela é a mulher que vai contra os tempos, as normas de uma sociedade, numa busca profunda de si mesma, do que lhe fazia falta, de encontrar e viver um grande amor, tornar-se mãe e sentir-se verdadeiramente viva.

Este é um romance riquíssimo. A ideia de uma sociedade rígida, representada pelo poder da religião e o paradoxo de saber que, no fim das contas, o grande adúltero é um padre. E mais do que isso, sublinhado a negrito, e repetindo, a ênfase que é dada ao papel feminino, sempre renegado. Esta mulher poderia ter largado tudo e fugir com a filha, mas ficou. Ousou ficar. Pagou pelos seus pecados de cabeça erguida, e neste comportamento se compra a necessidade de um novo pensamento, convicto, sobre a mulher e a sua relação com os homens.

Apesar dos anos volvidos deste a criação desta obra, sabemos bem que a actualidade ainda nos lança, infelizmente, muitos destes estigmas quando o assunto é a mulher. «A letra encarnada», escrito em 1850, vem relembrar aquela ideia, triste é verdade, de que ainda há muito trabalho a ser feito nesse sentido.


Por mais mulheres como Hester. Hoje e sempre.

Não preciso de lhe dizer que adorei ler este livro, não é verdade? 

E desse lado, quem já leu? Quem gostou? Quem quer ler?

Conte-me tudo nos comentários! 

Ah! E seja feliz! 

 💗

 

O grande Gatsby (F. Scott Fitzgerald)

quarta-feira, 20 de janeiro de 2021

 Leitura realizada em Dezembro de 2020

Não é à toa que «O Grande Gatsby», de F. Scott Fitzgerald, é considerado o grande romance realista dos Estados Unidos. Mais do que aquilo que poderíamos ter em conta como apenas uma história de amor entre um homem sem posses e a mulher requintada e fútil, este é um livro que nos explica - claramente - o que é ser americano num determinado período histórico, o do capitalismo americano e todo aquele movimento de ascensão que, parecia, não ter fim. 

O livro é narrado pelo moralista Nick, que se tornará vizinho do tão falado e comentado Gatsby, homem reconhecido na sociedade por ter crescido financeiramente sem, aparentemente, qualquer herança prévia. Ao longo da história vamos acompanhando os desabafos de Nick, mais pobre, e que vive numa casa simples rodeada das mansões mais ricas da cidade. 

Primo de Daisy, o grande amor da vida de Gatsby, Nick verá o nascimento da amizade com aquele precisamente pelo laço que tem à jovem. Há todo um passado que, no início da história, o nosso narrador não conhece. Há anos atrás, a prima e o carismático Gatsby haviam tido um intenso romance mas que, fruto da situação económica precária do rapaz, não ganhou raízes fortes para prosperar no tempo.

Daisy é a mulher com "voz de dinheiro" (uma das minhas expressões preferidas do livro), é fútil, vive na ociosidade e num vazio preenchido, apenas e só, pela força do dinheiro e pela azáfama de decidir a qual das festas comparecer. Precisamente pela sua futilidade, casa com Tom, homem rico de nascença.

Estão assim criados os alicerces que dão forma a uma aparente história de amor mas que, na verdade, é um apontar bem directo às desvantagens do cobiçado, e ilusório, sonho americano. Falamos dos anos 20, as grandes festas, o dinheiro fácil que quase parece surgir das pedras. A verdade, porém, é que ninguém sabe a origem da riqueza de Gatsby, sendo este o sinal de alarme que o autor pretendia passar sobre uma época muito assombrada pelos luxos, pelas idealizações e uma quase infantilidade na forma como se vive a vida.

Há mais na incógnita sobre a alegada riqueza deste homem. Daqui nascem as questões basilares de toda a obra: até que ponto se admiram os ricos? Até que ponto a riqueza é, afinal, tida verdadeiramente em linha de conta? E a moralidade? Confirma-se a moralidade na pessoa rica? 

O grande objetivo de Gatsby passa por impressionar a fútil Daisy que, casada com Tom, resultam igualmente num casal feito de futilidades, entretidos a serem "ricos juntos"

Fitzgerald capta as contradições da vida americana daquela época de forma magistral. Pelos aparentes subterfúgios de uma história de amor, o autor traz a cabo assuntos como a moralidade, a mão de Deus, os olhos que tudo vêem, sob o manto estragado do dinheiro, esse, o grande tema em torno destas personagens e transversal a todas elas.

Poderá o dinheiro ser a solução, final, para todos os problemas da vida? O que será isso de «sonho americano», debruado a notas e moedas? Poderá a moralidade entrar numa equação que nos parece, na linha de pensamento das personagens, algo tão obscuro de definir?

 

Este grande clássico da literatura assume, como todos os que já li, a grande máxima apregoada por Italo Calvino, de que um clássico é um livro que tem sempre algo para contar. «O Grande Gatsby» não é excepção e de uma forma muito inteligente, Fitzgerald faz-nos refletir não só sobre uma época muito específica de um país mas, também, sobre a complexidade que sempre define o ser humano. E sempre assim será. 

 💖

Seja feliz,


Reflexos num olho dourado (Carson McCullers)

terça-feira, 12 de janeiro de 2021


Leitura realizada em Dezembro de 2020

Gosto muito de Carson McCullers. Desde que li, há já uns bons anos, o seu «O coração é um caçador solitário», fiquei rendida não só à escrita da autora como a singularidade que coloca nos temas, por mais comuns que possam ser ou parecer.

Não foi diferente com «Reflexos num olho dourado». Nesta história conheceremos a vida de dois casais e a presença de um soldado como uma pinga de água persistente sobre uma pedra.

Nenhum destes casais é feliz e mesmo sendo eles todos diferentes, há uma linha de comparação que reveste cada uma das personagens. É o desconsolo. Estas duas mulheres e estes dois homens vivem desconsolados com a vida, de uma maneira ou de outra.

A história decorre no ano de 1939, numa base militar dos Estados Unidos. Ambas as personagens escondem segredos que, se revelados, destruiriam a pacata e ilusória paz das suas vidas. Será o soldado Williams que se atravessa nos caminhos de todos eles, imperando um auto questionamento e incitando à urgência de agir, de tomar um rumo.

Desde a mulher que trai o marido com o amigo, a esposa deste que se sabe traída mas sem coragem, ou condições, de mudar de vida, ao traído que por sua vez não assume que gosta de homens, temos um quadro humano que nos fala sobre as fragilidades e as sempre tão presentes complexidades que nos adornam enquanto pessoas.

As respostas aos anseios parecem sempre tão simples que, por isso mesmo, se vão complicando os dias, na tentativa iludida de dar um gosto diferente à vida, sempre tão igual, tão sem graça. É também uma história feita de caprichos e o medo de assumir as próprias sombras.

A imagem do soldado é magistralmente construída pela autora como uma inteligente metáfora sobre o véu nos próprios olhos, que queremos enxotar mas que só reavivamos a sua presença quando, de frente, encararmos o reflexo do olhar dos outros. Há sempre um pouco dos outros em nós. Um pouco de nós nos outros, não me dirá?


Uma pequena história cheia de importantes reflexões sobre a condição humana, sobre as suas complexidades e medos face a uma sociedade sempre tão castradora.

Boas leituras.



Seja feliz!

Memórias de um gato viajante (Hiro Arikawa)

terça-feira, 5 de janeiro de 2021

Leitura realizada em Dezembro de 2020

«Memórias de um gato viajante», da autora Hiro Arikawa, foi comparado aos filmes da Studio Ghibli. Pessoalmente, sou fã assumida destes filmes. Não houve um, até à data, que me tivesse desiludido. Há uma linha transversal à maioria destas histórias e que é, sem pestanejar, o tema da resiliência e a capacidade de transpor polaridades, vendo o lado melhor de cada situação.

Não é diferente nesta história, neste livro. Aqui conheceremos uma linda história de amizade entre um gato e o seu dono. E quando digo linda, é mesmo linda.

Para todos as pessoas que nutrem uma estima muito especial pelos animais, este livro terá um impacto ainda maior. Há certas questões que só mesmo uma pessoa que adore animais, conseguirá entender na plenitude. Um animal é, de facto, uma companhia muito fiel e ao contrário do que a maioria certamente pensa, também os gatos são dependentes dos donos e a aparente altivez, segundo estudos que li, é uma ideia que não aplica perante os seus donos. 

Nesta comovente história acompanharemos esta história de amizade. Desde o momento em que começa até ao seu amadurecimento. Nana é um gato de rua até ao momento em que Satoru o vê escondido na sua carrinha e, todos os dias, lhe leva alimento. Depois de um acidente, Satoru acaba por levar o gato ferido para casa e, desde então, nasce a amizade que lhes mudará as vidas.

Esta é uma história de amizade, de superação e de grande resiliência. Haverá um momento na vida da Satoru em que terá de se desfazer da companhia de Nana, por motivos pessoais que decide não revelar. Mas a vida tem estas artimanhas muito curiosas e nada do que o jovem faça, resulta numa nova casa para Nana. Aquele lema tantas vezes subestimado de que «aquilo que tem de ser, tem muita força» é espelhado de forma muito bela nesta história. Talvez olhar a vida com mais propósito e um pouco de magia, seja um dos grandes intuitos da autora. A meu ver, conseguiu-o de forma exemplar.

A vida não tem de ser focada, apenas e só, no que de mal nos acontece. Até porque o conceito de «mal» muitas vezes nada mais é do que o empurrão que precisamos para sair do marasmo dos dias e conseguir, plenamente, enxergar aquilo que realmente importa. Por muito cliché que possa soar, serão sempre as pessoas, o afeto e a bondade nas nossas ações, a tornar a vida um pouco mais colorida e, acima de tudo, com verdadeiro sentido.

💚

Uma história comovente e que recomendo a todas as pessoas, mesmo aquelas que não apreciam muito a companhia dos animais. Talvez, quem sabe, isso não mude no momento em que terminar as páginas deste livro enternecedor. 


Boas leituras. Seja feliz!

O café debaixo do mar (Stefano Benni)

segunda-feira, 4 de janeiro de 2021

Stefano Benni é jornalista e escritor. Os seus trabalhos são conhecidos, maioritariamente, pela sátira social. É exímio e muito singular na forma como o faz.

Em «O café debaixo do mar», conheceremos um jovem que, numa noite, ao deambular pelas ruas, depara-se com uma imagem insólita: um senhor, bem vestido, dirige-se ao mar, desaparecendo no mesmo sem mostras de aflição. Incrédulo, o nosso personagem segue aquela pessoa até se deparar com um curioso café debaixo do mar.

Está criada a base a um livro de histórias dispersas, aparentemente autónomas entre si mas que, somadas, caminham todas para o mesmo resultado: uma afiada crítica social, escrita de forma muito original.

Aquele café tem regras muito precisas, e todos parecem focados no respeito das mesmas. Cada pessoa para frequentar aquele lugar especial tem de ter uma história para contar. Desde o homem do chapéu, ao homem com a cicatriz, a sereia, a pulga do cão, o cão, a velha, a criança até ao cozinheiro, todos eles sem exceção, têm belas histórias para contar.

Inicialmente referi a tendência do autor para a sátira. Será facilmente compreendida esta questão no momento em que começa a ler cada uma destas histórias. Desde a gula metafórica, ao desprezo pelo outro, o ego inflamado por uma bicicleta e que acaba em tragédia, a necessidade de vincar uma opinião até só a morte parecer acalmar os ânimos, Stefano deixa constantes (e importantes) notas que nos pedem uma atenção mais cuidada aos nossos dias, à nossa vida e a vida dos outros.


Gostei muito, foi uma das grandes surpresas de 2020.

Conhece o autor?


Boas leituras e boa semana!

 💓

 

 

 Seja feliz,


Drácula (Bram Stoker)

sábado, 2 de janeiro de 2021

 Leitura realizada em Novembro 2020

Não será novidade para muitos que a personagem de Drácula incitou em muito à ideia comum sobre o vampiro, na imagem que a conhecemos: o medo da cruz, a pele pálida, ausência de sombra/reflexo, seres que gostam da noite, a sua beleza e enorme magnetismo. A atracão que imprimem nas suas vítimas é tal que aquelas, num primeiro momento, caem na tentação não na perspectiva de vítima mas porque, pura e simplesmente, não lhe resistem aos encantos. Creio que é precisamente neste ponto que o livro de Bram Stoker se demarca pela originalidade.

A verdade é que muito antes da sua publicação, o romance gótico já caminhava de encontro a uma maior relevância na literatura. Consta-se que o primeiro livro a focar-se no imaginário dessa figura foi o de Polidori (nascido em 1795, na Inglaterra), com o seu "O Vampiro", apesar da fraca recetividade na altura, dado que o romance gótico ainda estava longe de ser tido em conta.

Outros autores anteriores ao livro que hoje destacamos, já haviam ingressado por esta peculiar atmosfera. Dois desses exemplos, e que a mim muito me dizem, são a Mary Shelley (conhecida pelo seu «Frankenstein») e as irmãs Brontë, pela atmosfera sombria dos seus romances, sobretudo Emily. O conhecido Edgar Allan Poe é outro exemplo muito demarcado, tido inclusivamente como o grande fundador deste género literário. O cómico e bem disposto Oscar Wilde, numa fase em que este género estava já consolidado, também cedeu atenção a este tema para a criação da sátira social (que define tão bem o autor).

Tudo isto para reforçar a originalidade de Bram Stoker sem que, no entanto, lhe recaia a responsabilidade única do romance gótico como, erradamente, a maioria das pessoas pensa. Talvez pelo imaginário comum, pelo facto de ser uma história de que todos já ouviram parte, possa recair a falsa premissa de uma total criatividade em torno das histórias dos vampiros. Por isso mesmo, creio que é importante sublinhar a originalidade que o autor trouxe, especificamente, às características da personagem e que continuam, até aos dias de hoje, comummente interiorizadas.

Introdução à parte, «Drácula» é um livro cuja história se centra na vida de um conde da Transilvânia que decide ir viver para Londres, atraído sobretudo pelo avanço tecnológico que já se fazia sentir (1897) e pela facilidade em conseguir mascarar a sua essência e o encontro mais facilitado das suas vítimas.

Não estamos a falar de um livro cujo enredo se caracterize por um desenvolvimento muito profundo ou por uma escrita especialmente cuidada. Acredito que a força do livro está muito para lá disso. Sendo um romance epistolar, contendo além das cartas inúmeros recortes de jornais e diários, esta é uma história que sublinha o poder da amizade, da fidelidade e a ligação entre as personagens, tidas como verdadeiros heróis que vão até às últimas consequências para destruir aquele demónio e restaurar a paz nas suas vidas.

«Drácula» é também um apontar de dedos a uma cultura inglesa muito moralista e conservadora, aspetos esses que ainda vigoram nos dias de hoje. Desde a pontualidade à mesquinhez tão conhecida daquela cultura, a imagem do vampiro surge como uma espécie de libertação sexual (justificada no magnetismo irresistível do vampiro, cujas vítimas caem sem pensar), um contraste nítido à repressão do país. Se a mulher é tida como frágil e que o homem, machista mas cavalheiro, nasce para a salvar, também no livro vivemos a contradição quando vemos Mina, a mulher aparentemente frágil, a alastrar o seu poder e dedicação para ajudar o marido, tornando-se - a meu ver - a personagem principal.

«Drácula», por todos estes motivos, tornou-se um dos livros mais importantes a nível mundial, quer pelo género literário em que se insere, quer pelos temas escondidos em torno de um vampiro cruel e as suas vítimas, desamparadas.

Um clássico da literatura que vale a pena ler de início ao fim, não se deixando convencer apenas pelas ideias facilmente partilhadas. Há muito para conhecer ao ler a obra completa e daí, tirar importantes reflexões sobre uma época e da sociedade inglesa feita de peculiares, e tão atuais, costumes. 

 

Seja feliz,   

Ver: Amor

David Grossman foi uma das minhas felizes descobertas em 2020. «Ver:Amor» é a primeira leitura do ano e a expectativa é tão alta que só espero a confirmação daquele que poderá vir a tornar-se um dos meus escritores preferidos. Vamos ler.

 

Um Bom Ano. Um 2021 amigo do mundo inteiro.

 

Seja feliz,


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