Instrumental (James Rhodes)

quinta-feira, 26 de outubro de 2017

James Rhodes tem 38 anos e o livro com o título «Instrumental» é a sua biografia.
Poderá, o leitor, questionar-se sobre os motivos de um homem tão jovem decidir-se a escrever a sua própria história. E eis que chegamos ao ponto que me permite explicar-lhe: James Rhodes foi vítima de abuso sexual aos 6 anos, perpetrado pelo seu professor de educação física, durante mais de cinco anos.
 
"(...) a música, literalmente, salvou-me a vida (...)"
 
Mais do que um relato comovente, limpo e cru da sua vida, o autor oferece-nos a redenção através do poder da música. Foi com Bach que a oportunidade à música clássica se lhe surgiu diante dos olhos, ainda menino, numa espécie de antídoto ao mais cruel cenário de quem rouba, por quem dá cá aquela palha, a inocência de uma criança.
 
"Não se trata de abuso quando um homem de quarenta anos enfia à força a sua piça no cu de um menino de seis anos. Isso nem se aproxima de abuso. É uma violação agressiva. Isso redunda em múltiplas cirurgias, deixa cicatrizes (interiores e exteriores), tiques, perturbação obsessivo-compulsiva, depressão, tendências suicidas, automutilação grave, alcoolismo, vício de drogas, as maiores perturbações sexuais que se possam imaginar, confusão de género (...), confusão quanto à sexualidade, paranoia, desconfiança, mentira compulsiva, perturbações alimentares, perturbação de stress pós-traumático, transtorno de personalidade múltipla e assim sucessivamente."
 
Implacável, o autor discorre sobre aquilo que é o abuso mas, sobretudo, as consequências a todos os níveis da vida de uma pessoa.
 
O receio de comiseração ou os olhares de terceiros, muitas vezes traiçoeiros, fizeram-no ponderar escrever. No entanto, pesa a consciência de um certo dever em partilhar as suas amarguras, na tentativa de incitar novos comportamentos, um agitar de consciências que se traduza no olhar devido, atento e preventivo de situações do género.
 
James Rhodes escreve com um coração assolapado e abre-se perante o leitor nessa partilha dolorosa e muito íntima, sobre uma vida de provação e superação.
 
Ao longo da leitura, o leitor conhecerá James Rhodes enquanto criança, adolescente e, por fim, homem (des)feito. Todas as fases atribuladas da sua vida, todos os momentos, foram pautados pela música clássica.
Se esta é uma biografia de um homem vítima de abuso sexual, é também uma partilha de superação perante as adversidades mais cruéis, comprovando que se no coração ainda resta espaço para uma paixão, a vida ganha segundas e terceiras oportunidades.
 
São as paixões que nos movem. E as pessoas.
A música clássica ofereceu-lhe perspetivas diferentes das respostas que sempre ambicionou. As pessoas, traduzidas no seu filho e na mulher que viria a amar incondicionalmente, mostraram-lhe a capacidade do ponto final. E o parágrafo do que virá depois.
Que seja a esperança.
 
Recomendo sem reservas.
 
Esta leitura contou com o apoio:
 
 
 
 
 
Boas leituras, muitos livros.

Onde?

quinta-feira, 19 de outubro de 2017

Onde tinhas a cabeça?
(...)
No coração.
 
 
Tão bonito.
Uma jovem de 17 anos.

O Romance Gótico (Virginia Woolf)

segunda-feira, 16 de outubro de 2017

Centrando-se no trabalho de Edith Birkhead, pioneira na arte do romance gótico, Virginia Woolf, no seu modo acutilante que já não nos estranha, mostra alguns dos seus  pontos de vista sobre as particularidades do género literário em questão.
 
A autora promove uma reflexão sobre o romance gótico e, sobretudo, o ponto alto que lhe permite ser apreciado. Na opinião de Virginia, nada há de novo ou interessante desde os seus primórdios, em 1764 com a conhecida obra «Castle of Ortranto» de Horace Walpole, considerado o primeiro romance gótico alguma vez escrito.
 
De forma sucinta, para Virginia Woolf, descrever um cadáver, uma assombração talvez, o vampiro ou outros, não escapa a uma espécie de neblina forçada, de quem sabe e não quer ver ou de quem quer ver, mesmo sabendo. Há uma ideia generalizada, neste ensaio, de uma presunção à partida, bem como a dificuldade e mestria necessárias, na escrita de um romance gótico. Quase morto às nascença.
 
Produzir o efeito de terror no leitor parece-lhe quase infundado, baseando-se numa crença que lhe justifica o que diz:
 
"São os nossos fantasmas interiores que nos fazem estremecer, e não os cadáveres de barões em decomposição ou as actividades subterrâneas de vampiros."
 
Serão os nossos fantasmas interiores os responsáveis pela tendência de procurar emoções fortes sem o perigo iminente, num pressuposto cobarde de não conseguirmos olhar para dentro?
 
Um ensaio de uma mulher que, como sempre, nos transcende, nos obriga a refletir para lá do óbvio, do aparentemente normal. Como só Virginia nos faz crer, na vida há sempre essa ponta solta a relembrar os fantasmas que nos assistem, e que nos ultrapassam, face às tentativas diárias de lhes escapar.
 
 
Um livro essencial.
Boas leituras,

Filhos e Amantes (DH Lawrence)

segunda-feira, 9 de outubro de 2017

Considerado uma das obras-primas da literatura do século XX, «Filhos e Amantes» de DH Lawrence foi, inicialmente, recebido numa onda de polémica. Algumas passagens, inclusivamente, foram cortadas pelo editor. Na altura, o autor acabou por aceitar, referindo: "(...) quero lá saber se [o editor] vai cortar uma centena de páginas duvidosas de «Filhos e Amantes». O livro tem de se vender, preciso do dinheiro para viver."
 
Tudo começa com a união de um casal.
Quando Mr Morel decide casar-se, fá-lo com paixão. E a mulher também. Uma história simples de amor que pareceu surgir do nada mas que na mesma proporção, parece extinguir-se na força dos dias. Pesados. Rotineiros. Disformes e desorganizados, em que o nascimento do primeiro filho ditará, para sempre, a separação iminente com laivos de uma raiva nunca exteriorizada.
 
«Filhos e Amantes» é a história de um amor materno doentio. Uma mãe que deixou de viver para si para se entregar, sem arnês, ao amor recebido e quase reclamado, dos seus filhos. É Paul quem melhor a conhece, a estima e preserva. Dos quatro filhos nascidos, será a simbiose desta mãe e do filho mais novo, a força constante de uma história por vezes delicada, por vezes angustiante.
 
Que a família nos pesa na alma, não é novo. Que a família nos incendeia os prenúncios daquilo que viremos a ser um dia, também não é novo. Mas mesmo as coisas que não nos são novas, não deixam de nos fazer refletir.
 
A forma como DH Lawrence expõe os demónios de um jovem que anseia voar por si interdito pela sombra de uma mãe que nada parece pedir, angustia e reclama reflexões cuidadas sobre o papel da família, dos elos aparentemente inocentes.
 
Um cliché, talvez. Porém, uma necessidade reconhecida.
Paul viu-se impedido de amar Miriam, jovem doce e inocente, ainda assim com garras capazes de o transformar naquilo que jamais ambicionara. Viu-se igualmente impedido de uma entrega verdadeira a Clara, mulher com o coração desarrumado, ainda assim, capaz de o amar.
 
Viu-se impedido de si mesmo.
De início ao fim, Paul é a personificação do medo de ir, para ficar, sem ficar. A amálgama de complexos imprimidos ao longo do tempo para nos mostrar, quase sem dó nem piedade, a fragilidade com que somos feitos. Uns bebés grandes a desejar, ainda assim, o quente de um colo expirado há muito.
 
Angústia maior, em prol de um amor que oprime, dificilmente se encontra.
 
 
Gostei muito. E recomendo.
Boas leituras,

Histórias de adormecer para raparigas rebeldes (Elena Favilli)

terça-feira, 3 de outubro de 2017

O livro «Histórias de adormecer para raparigas rebeldes», de Elena Favilli, presenteia-nos com a vida de 100 mulheres extraordinárias que souberam fazer a diferença, e cuja presença se mantém firme até aos dias de hoje.
 
Numa edição lindíssima e repleta de ilustrações distintas, o leitor terá a oportunidade de conhecer a vida de muitas mulheres que, firmes nas suas convicções, não desistiram de sonhar e dar forma às suas crenças.
 
Atualmente, que tanto se fala sobre a diferenciação de género, convido-o a ler este livro sem esse tipo de reserva. Este é um livro sobre mulheres mas, sublinhando a negrito, não apenas para elas. A autora consegue, com a obra, provar que sob a perspetiva de um olhar atento e consciente, homens e mulheres podem apreciar as conquistas de cada um, sem que o pipi ou a pilinha determinem o grau de importância das mesmas.
 
São mulheres, são pessoas como qualquer outras.
A grande diferença reside, precisamente, na capacidade de sonhar e levar adiante aquilo que carregam no espírito. É essa força de espírito que caracteriza a maioria das mulheres aqui presentes: pintoras, bailarinas, investigadoras, escritoras, modelos, entre tantas outras, mostram-nos, pela sua jornada de vida, que independentemente das adversidades, o caminho é feito sempre em frente.
 
Um livro que terá presença assídua por aqui.
 
 
Recomendo.
Sonhe muito,

Intrigas

domingo, 1 de outubro de 2017




Porquê rio Douro se ele
não é feito de ouro?

O Principezinho mais velho e as suas questões sempre pertinentes.
(Risos)
 
 
 
Bom Domingo,
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