A Música do Acaso (Paul Auster)

segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Ele entrou no carro e não pensou mais.
O baralho de cartas derramou destinos.
E ela está do outro lado da rua.
A rir-se.

“I’m here for your entertainment. And more.”



Ao som de: Adam Lambert “For Your Entertainment”

Florbela Espanca - Poesia Completa

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

«Noite Trágica»

O Pavor e a Angústia andam dançando...
Um sino grita endeixas de poentes...
Na meia-noite d'hoje, soluçando,
Que presságios sinistros e dolentes!...

Tenho medo da noite!... Padre nosso
Que estais no céu... O que a minh'alma teme!
Tenho medo da noite!... Que alvoroço
Anda nesta alma enquanto o sino geme!

Jesus! Jesus, que noite imensa e triste!...
A quanta dor a nossa dor resiste
Em noite assim que a própria Dor parece...

Ó noite imensa, ó noite do Calvário
Leva contigo envolto no sudário
Da tua dor a dor que me não 'squece!


Vai com calma.
Já não sei o que mais preciso de pedir. Calma ou um pouco mais de raiva.
Essa inércia de quem tudo quer e apenas se deita numa cama resignada cansa. Ela pergunta. Queres o quê?
Faz-me gritar. Faz-me berrar. Faz-me bater-te.
Queres o quê?
Essa tua doença alastra e consome quem está por perto. Tão inerte e já nem sei o que é ter vontade de dançar, cantar ou, apenas, sonhar.
Queres o quê?
Eu já não tenho bolas de sabão, nem tão pouco mundos cor-de-rosa. Não há nada que possa dar.
E tu nem me fazes gritar. Faz-me gritar. Zanga-me.
Era uma vez num mundo de lençóis soltos, histórias somente perdidas pelo tempo, e retratos estagnados em paredes imaginárias.
Queres o quê?
Aquela casa já não existe. Nem tão pouco aquele cenário doentio.
As promessas ela mesma queimou.
Não precisa.
6 Portas mal abertas. Tem o cadeado na mão, e a 7º Porta ainda nem abriu.


Às noites trágicas. E ao medo de amar.
Ao som de: Adam Lambert “Whataya Want From Me”

As Terças com Morrie (Mitch Albom)

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Não comprei aquele casaco vermelho, de pêlo, com receio do pensamento das pessoas.
Não comi aquele bolo de chocolate com receio do pensamento do espelho.
Não saí naquela tarde de Domingo porque os testes dos meus alunos precisavam de mim.
Não chorei quando foste embora porque precisava de te mostrar que era forte.
Não me parti a rir quando a minha colega caiu e partiu uma perna.
Não disse merda em nenhuma aula.
Não comi batatas fritas em 90% das vezes que tive vontade.
Não chorei 100% das vezes que quis.
Não tive festas em meu nome.
Não fui reconhecida pelo meu árduo trabalho.
Não fui reconhecida como mãe.
Não tenho sapatos de 500 euros.
Não aprendi a cozinhar.
Não sei cantar, como sonhei.
Não perdi tempo a ouvir o som da chuva.
Não li um livro, devorei-o pela pressa do relógio.
Não. Não. Não. E não. Camadas de «não».

Não!

Não me digam que nunca é tarde!

Não!

Não digam!


Ao som de: One Republic “Apologize”

O Monte dos Vendavais (Emily Brontë)

sábado, 11 de dezembro de 2010

Porque não. Porque sim. Porque penso. Porque é. Porque não é.
Talvez. Sim. Não. Nim.
Confortável. Difícil. Cómodo.
Árduo. Saudade. Desejo.
Porque não. Porque sim.
Porque te amo. Mas porque não.
Porque quero, e não quero.
Dói e é bom. Mas não sei.

A esquizofrenia conquistou o amor.
Tamanha complexidade, que jamais aceitarei.

Vou correr em dias de chuva, porque sim.
Vou comer chocolate, porque sim.
Vou dançar nua na janela, porque sim.
Vou continuar os sonhos de ontem, porque sim.
Vou amar… só simplesmente porque SIM!


Um brinde à simplicidade da vida, e um tiro certeiro a quem a come ao pequeno-almoço.

Num dia pleno.

Ao som de: Nelly Furtado “Explode”

A Vida Nova (Orhan Pamuk)

domingo, 5 de dezembro de 2010


As palavras dizem tudo e não dizem nada. Tenho um saco, cheio delas, só para ti, mas nenhuma delas te leva o meu olhar quando não estás.
Continuo a entrar em cada autocarro que vejo.
As estradas são todas iguais, os caminhos são contornados pelo desespero da espera e pela esperança que estejas lá, naquele lugar de sempre. Mas nunca estás.
Sinto, perdido no ar, o som do teu riso, o toque das tuas mãos, os longos cabelos perdidos no meu ombro, a ausência das palavras que disse tudo. O teu vestido azul.
Solto as palavras pela estrada fora.
Não preciso delas. Na certeza de que preciso de ti, entro no último autocarro.



“Conta-me uma história, Pew.
Que tipo de história, pequena?
Uma história com um final feliz.
Não existe tal coisa no mundo inteiro.
Um final feliz?
Um final.”
A Menina do Farol (Jeanette Winterson)

Ao som de: Switchfoot “You”

Metamorfose (Franz Kafka)

sábado, 4 de dezembro de 2010

Entra no meu quarto. Hoje afastei todas as mobílias, estou a crescer em mim, dentro e fora. Entra e dança comigo, e toca-me. Em cada ponto. Em cada ponto igual ao teu. Só porque sim. Só porque queres.
Os nossos corpos transformam-se naquilo que tanto os assusta.
Lá fora, os nossos amigos rastejam pela janela e fazem-nos companhia. A noite é nossa e sabemos que podemos brilhar, como estrelas, num mundo que nos pertence por lei.
Os outros quase partem a porta, deixámos de ser o esperado. Somos agora meros insectos.
Arrombamos a porta, porque somos muitos, e não precisamos de sair pela fresta, continuamos a dançar por esse mundo fora, tal como somos.
E não nos podem pisar. Somos grandes. Dignos de respeito.


Dedicado à homossexualidade.
Aos muitos Tyler Clementi, com bombas-relógio presas no estômago.


Ao som de: Kesha "We R Who We R"
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