Os Memoráveis de 2020

quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

Chegou o momento da publicação tradicional aqui no blogue: os meus memoráveis do ano de 2020. Li muito este ano, em parte por toda a realidade de um ano que nos obrigou a ficarmos fechados em casa. Não foi dos meus melhores anos literários, contudo, consegui reunir o meu top 10 com as melhores surpresas, com grandes livros e histórias inesquecíveis. 

Patrícia Muller foi a grande surpresa nacional.

Adorei conhecer a estranha Angel de Elizabeth Taylor. 

Daniel Mason veio reafirmar a beleza da sua escrita e fez-me conhecer uma das personagens da literatura que ficará sempre comigo: a pequena Isabel e o seu amor incondicional pelo irmão. 

Richard Yates voltou ao meu caminho para me relembrar que não há ninguém como ele para escrever a tristeza. E convenhamos, há momentos na vida em que precisamos de ler tristeza, de confrontar medos e ansiedades. Foi o livro que li em pleno confinamento e foi, sem dúvida alguma, uma companhia muito fiel. 

Irène Némirovsky a comprovar o quanto é, para mim, uma das melhoras escritoras. Creio que «Jezabel» é uma das suas obras mais marcantes. Até onde vai a vaidade e o narcisismo de uma mulher? Brilhante. Sempre brilhante. 

Foi também o ano em que conheci David Grossman e apaixonei-me de imediato. Quero ler tudo, tudo o que este homem escreve. Que escrita sensível, que de tão linda até parece que nos arde o peito. Uma linda história sobre o amor incondicional de uma mãe. Conheci Thomas Hardy e também este autor me deixou a vontade de ler tudo dele. Foram descobertas assim que me marcaram o ano: livros e autores que me fizeram querer conhecer mais e mais. 

A confirmação do talento de Lars Saabye Christensen foi a grande prenda. «Meio-Irmão» foi, sem margem para duvidar, a minha melhor leitura deste ano. Um livro que é uma família inteira, nas suas particularidades e nas suas peculiaridades. Sabemos bem que todas as famílias são peculiares e que, talvez por isso mesmo, seja a terra fértil onde crescemos e amealhamos os sonhos que nos enchem os dias.


Desejo-lhe um 2021 feliz, muito feliz.


Boas leituras,

Nenhum Olhar (José Luís Peixoto)

terça-feira, 22 de dezembro de 2020

 «Nenhum Olhar», de José Luís Peixoto, foi provavelmente o livro mais triste que li este ano. Esta é uma história escrita pela mão tão forte da tristeza, que é pesada, quente como o sol, mas que queima como um inferno em plena terra.

José Luís Peixoto escreve como ninguém. É, sem sombra de dúvida, um dos meus escritores portugueses contemporâneos preferidos. Na sua escrita podemos sempre contar com uma sensibilidade feita de duas pernas, que corre veloz e alastra-se em todos os cantos das pessoas que compõem esta história.

Narrada numa aldeia pacata do Alentejo, conheceremos uma pequena comunidade, toda ela triste e fragmentada entre a nostalgia de um passado, o arrependimento e o vazio de um futuro desconhecido mas certeiro na mágoa que promete.

Podia descrever a história de início ao fim, contando a história de vida de José, a bebida, o Gigante, o Demónio, a mulher de José, a cozinheira solteirona, os irmãos gémeos presos por um dedo mindinho. Poderia contar-lhe que esta é a história destas pessoas e de um homem preso numa casa a escrever e uma voz dentro de uma caixa, lúcida e orientadora.

Poderia, sim, descrever-lhe a dor de cada um em separado mas todas as minhas palavras iriam escoar na verdade única (na minha opinião) de «Nenhum Olhar»: este é um livro sobre a vida e tudo o que nela se agarra à nossa passagem desatenta. É a vida que vai acontecendo como uma manta de retalhos, o passado que não se resolve e se adianta às gerações futuras. É também uma tocante homenagem ao amor mais puro, ao arrependimento e à honra que endireita a coluna e nos permite andar de cara virada ao sol, ou não. E a violência como redenção, como quem se entrega, cansado, tentando remediar modos de vida que não cooperam com a gente. Modos de vida pesados que seguem, ritmados e congruentes, com todos os corações tão tristes que vivem dentro destas páginas.


Um livro de enorme sensibilidade. Um livro sobre pessoas magoadas. Um livro sobre pessoas que não ousaram sonhar mais do que a conta. O medo dos créditos mal parados em assuntos do coração e a punição pesada da culpa.


Recomendo.


 

Seja feliz,

A mulher que correu atrás do vento (João Tordo)

segunda-feira, 14 de dezembro de 2020

João Tordo acaba sempre por nos surpreender pela originalidade das suas histórias. Não é diferente com esta «mulher que correu atrás do vento».

Neste livro acompanhamos a vida de quatro mulheres, um século que as atravessa e o amor como personagem principal. A história começa com Beatriz (1991), uma aspirante a tradutora, apaixonada pelos livros, saudosa da mãe já falecida e que acaba, por arte do destino, envolvida amorosamente com o autor de um livro que não suporta ter gostado tanto, mas gostou.

Ao longo da história de Beatriz, outros livros se abrem para nos contarem a história de Lisbeth Lorentz (1892), professora de piano e cuja vida fora pautada por grandes desvios emocionais e um crime que carregava ao ter abandonado um aluno seu de 13 anos, por quem se apaixonou quando percebeu o seu enorme talento. 

Voltamos atrás e percebemos, nos diálogos sinceros de Beatriz, o cansaço e o desajuste da sua própria vida. Recém-chegada a Lisboa, para ingressar na Universidade, não sabe o que fazer com o tempo vazio dos dias, que a carga horária das aulas está longe de chegar. Com isso, torna-se voluntária num abrigo para mendigos onde conhecerá Lia, uma jovem perdida, a quem ninguém conhece o passado.

Será através da curiosidade de Beatriz por Lia que acabará a entrar na história não só daquela, mas também de Graça Boyard, fugida de Lisboa durante as cheias de 1967, para escapar à ditadura e abandonando a sua filha ainda pequena.

Este será o mosaico de histórias que o autor, habilmente, constrói para dar vida a uma história cujo amor se assume não só como personagem principal mas, e acima de tudo, sobre o poder do tempo e das memórias que não se arrumam, acabando por definir os futuros das vidas de quem, em sintonia, não encontra poiso certo.

João Tordo deu voz a um livro que se compara, também, às clássicas bonecas-russas. Há histórias a escorrer dentro de uma só, que por sua vez, se desdobra em tantas outras, com pessoas iguais ou diferentes mas que acabam, de uma maneira ou de outra, por se encontrarem no fim do caminho.

O final desta que é uma história em mil para se subtrair e restar apenas uma que as conta a todas, deixa-nos a refletir o quanto somos um sopro. É que nunca é de mais pensarmos sobre esta verdade tantas vezes esquecida, porque dá jeito, e nós, distraídos, vamos vivendo como quem escapa entre pingos da chuva. Todas estas mulheres, sem excepção, abraçam o mesmo medo e o mesmo arrependimento. O medo de quem não viveu a excelência dos sonhos e o arrependimento de quem, mesmo correndo contra o vento, não se rebelou o suficiente contra as mágoas do passado, o único capaz de imprimir a força do, para sempre, irremediável.

 

 

Com o apoio: 

💗

Seja feliz. Boas leituras.


O barrigudo chegou

quarta-feira, 2 de dezembro de 2020

Se eu lá chegar, com oitenta anos ainda vou adorar o Pai Natal e ser uma daquelas pessoas irritantemente natalícias. Se joga do lado oposto, os que torcem a cara para falar mal do Natal e que, ora bolas, são só desculpas para consumir o que não se precisa, bla blá blá, eu estou convosco mas penso o seguinte: cada um gasta o que quer, cada um vive como quer. Acredite ou não, essa é a verdadeira magia do Natal, a tal que deveria ser transposta a todos os dias da sua vida: viva, deixe viver e nesse intermédio, espalhe felicidade aos outros. Ela virá, em ricochete, e em dobro, só para si. E esta?

Para todos, os que amam, os que odeiam: UM FELIZ NATAL!

Faça deste mês o ponto de viragem. O facto de vivermos um ano repleto de desafios não significa que o seu último mês não possa vir cheio de esperança. E vem mesmo. Escreva aí.

Já se irritou o suficiente?

Ok. Fiquemos, então, por aqui.

Só mais uma coisa: SEJA FELIZ!

(já parei).

 

Não há nada mais irritante do que ser feliz. Atreva-se.

Seja feliz,


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