Dinheiro e Amor (Virginia Woolf)

segunda-feira, 31 de outubro de 2016


Através de um trecho de uma biografia, neste ensaio «Dinheiro e Amor», Woolf aponta o dedo a estas duas questões que, aparentemente, não se conseguem casar. Mas mais do que isso, a autora sublinha aqui a mesquinhez em detrimento dos afetos, esses, que deveriam assumir um lugar cimeiro na vida de qualquer um.
 
Ora. Sabemos muito bem que deveriam assumir sim, mas que nada disso corresponde à verdade. Sobretudo, nos dias de hoje. Dias rápidos como a comida do McDonald's.
 
Pessoalmente, eu não percebo. Não percebo a desordem sentimental e o desentendimento dos dias de hoje. Virginia Woolf enfatiza a impossibilidade de se acreditar nisso mesmo, nos amores aparentemente impossíveis, com base nos estatutos sociais, e não só. Na dificuldade em acreditar.
 
O dinheiro parece imprimir uma marca de água na pessoa, que a destaca, que a diferencia, que a torna imponente na forma de ser, de estar, de sentir. Acontece que tudo isso não passa de uma mera mesquinhez de quem vê (não sente) o coração apenas como instrumento.
 
O amor tem a desfaçatez de surgir onde menos se esperaria e é por isso que simpatizo tanto com ele. Distorce tudo o que, eventualmente, seria para ser de uma forma expectável só porque sim, porque faria muito mais sentido. Mas entendam isto, de uma vez por todas: em assuntos do coração nada faz sentido, nada é para se conjugar com as cores e humores dos dias.
 
Nos assuntos do coração, quem manda é desconhecido.
E felizes são os que alinham, sem questionar.
 
 
Não encontrarás a paz ao evitares a vida.
A Virginia é que sabe.

 

Lágrimas para o molhar

domingo, 30 de outubro de 2016


"A menina, habitante sobretudo dos sonhos, disse: havíamos de ter um jardim seco. Um de pedras que fizesse o ondulado do mar. Tão bem alinhado que fosse um desenho perfeito por onde poderíamos percorrer os dedos. A criada perguntou: seco. A cega respondeu: teríamos sempre lágrimas para o molhar. E sorriu.
 
Valter Hugo Mãe | Homens Imprudentemente Poéticos
p.34 e 35

O Segredo

sábado, 29 de outubro de 2016

"Tenho um segredo para lhe contar:
A Joana deu-me um pontapé na pilinha.
Oh. Tenho a certeza que foi sem querer?
Não! Foi sim! E eu agora tenho medo de morrer.
Que ideia. Vais ficar bem num instante.
Oh. É que não foi na pilinha...
Então?
Foi nos tomates!"
 
Conversas reveladoras com um menino de 7 anos.
Os medos na infância são como os dias: enormes e inacabáveis :)
 

A Curva de um Vida (Vergílio Ferreira)

sexta-feira, 28 de outubro de 2016

Tirar fotografias logo pela manhã, com pouca luz, dá nisto: este "grão" fantástico. Vamos sobreviver :)
 
O desafio do «Ler(-te) em Português do mês de Outubro não poderia ter sido melhor. Uma pequena novela de Vergílio Ferreira, a sua primeira obra editada, que recomendo sem reservas.
Apesar da sua brevidade, esta história prima, sobretudo, pela agressividade e dureza das palavras tão bem impostas pelo autor. Existem aqueles momentos, pela força do que ali se diz, que há quem se possa arrepiar. Os sentimentos, quando distorcidos, quando tolhidos e traídos, podem resultar num desfecho pouco previsível, adornado em condutas para lá do aceitável. No entanto, na cabeça de quem as pratica, fará todo o sentido, indo de encontro à obscuridade de um coração que perdeu o norte.
 
Vergílio Ferreira em «A Curva de Uma Vida» conta-nos a história de uma violação. Mas mais do que isso, há o envolvimento de todas as partes e uma amizade outrora muito relevante, muito estimada.
 
A partir do reencontro destes dois amigos, Fernando e Amadeu, serão conhecidos os motivos para tão grande desordem emocional em Amadeu, com um Fernando, advogado recente, na obrigação ética de uma aparente defesa ao amigo.
 
A questão é: como poderá defender Amadeu, quando este violou a sua irmã de 15 anos? Poderá aqui a ética profissional, e a deontologia, figurar de alguma maneira?
 
Uma história que nos deixa absortos, e em aberto, perante uma série de questões com que a vida, tantas vezes nos brinda. Eu falo de questões relacionadas com os amores maiores que tudo, capazes de condicionar a vida inteira, apontando a mira na direção certa... ou errada.
 
Uma novela pequena, de facto. Mas grande em si mesma pela sublime mensagem que nos oferece.
 
 
Muito recomendado.
Boas leituras.


 

Inversão de Papéis

quinta-feira, 27 de outubro de 2016

 
 
Sobre a Ovelha Choné:
 
"Adoro! Adoro! Adoro!
Estás a gozar comigo?
Não! É espetacular. E o jogo, conheces?
Tu estás mesmo a falar a sério...
Gosto muito da Timmy mas nada bate a Shirley, não achas?
[Silêncio]
Porquê que tu gostas da Ovelha Choné?
Porque é brutal!
Mas tu és grande.
E?
Os grandes só gostam de coisas aborrecidas."
 
 
Conversas espetaculares em que a criança sou eu.



O Amor é assim!

 
O amor é a melhor coisa do mundo.
Mesmo quando corre mal.


Lidar com a Ansiedade

quarta-feira, 26 de outubro de 2016


 
"Mas quando estás assim [ansioso], o que achas que podes fazer para te sentires melhor?"

"Dar ... peidos?"

 
 
Grandes males. Grandes remédios :)
Uma  pequena pérola de 6 anos, sem papas na língua.

O dono disto tudo

terça-feira, 25 de outubro de 2016

 
 
Quem manda aqui?

A Heart Full Of Love

segunda-feira, 24 de outubro de 2016

O resto são tretas :)
 

Como se deve ler um livro? (Virginia Woolf)

domingo, 23 de outubro de 2016

















Sabem aqueles livros que se instalam, desavergonhadamente, na mesinha de cabeceira? Este é um deles, que veio para ficar. Um livro que eu não largaria por nada. Uma preciosidade.
Por esse motivo resolvo partilhar alguns (todos!) dos melhores ensaios que já tive oportunidade de ler desta escritora que dispensa qualquer tipo de apresentação.
 
Em «Como se deve ler um livro?» o leitor terá a oportunidade de se debruçar sobre um ensaio muito interessante com algumas sugestões da autora quanto à arte - porque é uma arte - de ler um livro.
 
Em primeiro lugar, que se pense como o escritor. É isto que pensa Woolf. Ler deve passar, num primeiro plano, por encarar e pensar o livro (e a leitura) como o autor que o criou. Só depois, passar para o outro lado, o do juiz, analisando e criticando.

Outro dos pontos a merecer destaque, é a diferenciação do género literário. A nossa disposição, enquanto leitor, não pode nem deve ser a mesma. O trabalho a encarar é, necessariamente diferente, logo, o nosso estado de espírito e entrega não pode ser igual:

"Todas as biografias e livros de memórias e todos os livros híbridos que são largamente compostos por factos servem para recobrar a energia para ler livros a sério - isto é, obras de pura imaginação."

De uma forma leve mas segura, a autora liberta, assim, algumas estratégias de leitura com base nos diferentes livros com que, ao longo da vida, o leitor se cruzará.

Mais importante de tudo, para mim, reside nessa fase final: a de criticar. Analisar o livro depois de lido na sua totalidade, não como fragmentos do que se vai lendo mas já numa fase posterior, com toda a história assimilada. Para a autora, é determinante não nos basearmos nas críticas alheias sem que antes formemos a nossa:
 
"Ler não se resume a empatia e compreensão; também é crítica e julgamento. (...) depois de o livro terminado, o leitor deve sair do banco dos réus e vir sentar-se entre os juízes. Deve deixar de ser o amigo e passar a ser o juiz."

Mais do que essa fase, portanto, segue-se depois a referida análise pessoal que só depois de bem sustentada, nos permite analisar em conjunto com outras, agora sem o risco de comprometermos as nossas próprias opiniões. A autora defende o mesmo dizendo:

"É quando melhor podemos defender as nossas próprias opiniões que mais proveito podemos tirar das deles."

Um dos ensaios que mais gostei de ler. Adivinham-se, para breve, novas resenhas sobre mais ensaios de um livro que considero obrigatório. Na mesinha de cabeceira ou noutro lugar qualquer, mas sempre perto de si.

Boas leituras.

Unsteady

sexta-feira, 21 de outubro de 2016


Hold, hold on, hold onto me
'Cause I'm a little unsteady
A little unsteady
Hold, hold on, hold onto me
'Cause I'm a little unsteady
A little unsteady


If you love me, don't let go.

Chamam-se de «amor»

 

"A Catarina trocou-me pelo Tiago.
Imagino que isso te tenha deixado muito triste...
[Silêncio]
Muito triste. E sabes o que eles fazem?
O quê?
Chamam-se de «amor».
[Silêncio]
 
 
O amor, aos 7 anos de idade, também dói.

32

quinta-feira, 20 de outubro de 2016


 
"Mas que idade tem, afinal? Eu tenho 7 anos!
Ah... eu tenho muitos. Tenho 150.
Oooo! A sério? Não acredito.
A sério. Sou muito velha.
Ai não sei se acredito.
Que idade me darias, então?
Não sei bem... mas penso que terá mais de 10..."

 
Ele tem razão. E hoje conto, precisamente, 32.
 
Conversas com uma criança encantadora.

Gaveta de Filmes | Me Before You

segunda-feira, 17 de outubro de 2016

 

Não li o livro, mas decidi ver o filme. Adorei. História lindíssima sobre um tema que muito merece que nos debrucemos sobre ele: a eutanásia.

Recomendo.

A descoberta

sexta-feira, 14 de outubro de 2016




" Já sei como se chamam os filhos dos carneiros!"
"Como se chamam, então?"
"São os... corneirinhos!"
 
O meu Principezinho, 6 anos de idade

Psicologia(s) #7

quinta-feira, 13 de outubro de 2016










Realidade: As mentiras deixam a língua preta.

LOP#2 Narcisismo Parental

quarta-feira, 12 de outubro de 2016



Os tempos vão mudando e eis que já vai longe aquele em que os pais representavam um poder obstinado, um respeito disfarçado a medo, cujo tom de voz não poderia ultrapassar o aceitável pelas leis de uma família que se quer arreigada nos limites, nas hierarquias, nas posições.
 
O papel atual dos pais situa-se entre amor e amizade. Penso que este último é um dos fatores determinantes para a disfuncionalidade tão patente nas famílias atuais, sobretudo, no que ao relacionamento entre pais e filhos diz respeito.
 
Não. Pode até ser um cliché que se tem vindo a propagar, mas é mesmo verdade: os pais não têm de ser - nem devem - amigos dos filhos. Como fazer entender, e direcionar, as pessoas para algo tão óbvio, mas que soa sempre tão, incrivelmente, cruel e frio?
 
Vejamos de forma sucinta: os pais são pais. Tão somente assim. São aqueles que transmitem essa dádiva da vida, que a propagam e que, bem ou mal, farão os possíveis para que a criança se sinta amada, protegida e integrada no mundo. Se dentro deste prisma a amizade pode ser contemplada, acredito que sim, mas não da forma atual como é vivenciada.
 
E sabem porquê? Porque até os pais, na condição de pais somente, passam a vida a competir uns com os outros. Imaginem um grande Jardim Infantil com pais lá dentro: qual deles brinca mais e melhor, qual deles vem munido de mais brinquedos topo de gama e qual deles é o mais fixe, capaz de conversar com o pessoal todo?
Sim. A minha ideia era mesmo transmitir um cenário ridículo.
 
Atualmente assiste-se a uma transferência de responsabilidades e papéis, em que a criança é obstinada nos seus desejos e vontades perante pais submissos, sedentos de agradar porque: "(...) ela é ainda uma criança, tem tempo para saber o que custa a vida dos grandes."

A questão é que não há tempo nenhum, meus caros. O tempo é agora. A educação começa desde logo. Saber que um bebé com 7 meses já tem a capacidade de distinguir o «sim» e o «não» através da expressão facial da mãe, deveria ser um alarme (gritante) para muitos dos pais que vão arrastando essa arte de educar, compensada antes pela arte das cedências.

Tudo isto para sublinhar o ponto mais importante em torno destas novas relações parentais. É que mais do que o desejo de agradar, de retardar sofrimentos e birras, esconde-se esse narcisismo parental. Vejamos, todos nós queremos ser amados e apreciados. Ninguém gosta de castigos, de chamadas de atenção e de apontar de dedos. Muito menos do «tempo especial» que os chatos dos psicólogos inventaram, levando a criança para a cadeira ou para um cantinho especial da casa, refletindo sobre as suas ações. Qual quê, ninguém gosta disso. Muito menos, de quem o ordena.

Assim, pela garantia da suposta ordem emocional, da segurança de se ser amado, que se faça vista grossa a birras e choros fáceis. Haverá sempre um pequeno e novo capricho ao qual se poderá recorrer em prol, claro está, do bem-estar da criança.


Temos de refletir, então: porque será que os miúdos tanto adoram aqueles professores mais autoritários, ainda que simpáticos?
Todos nós precisamos de diretrizes. De regras. De orientações.
E, obviamente, o «não» e o eclodir de birras e insatisfações são determinantes para um crescimento saudável, que saiba balançar os diferentes lados da vida, permitindo reconhecer que o equilíbrio da felicidade passa, precisamente, pelas oscilações entre o lado bom... e o lado mau.
 
Sejam felizes.

Do Medo à Esperança (R.Varela e A. Coimbra de Matos)

terça-feira, 11 de outubro de 2016

«Do Medo à Esperança», de Raquel Varela e António Coimbra de Matos é um livro de ensaios, género literário que muito me diz, e que só posso recomendar.
Num tom intimista de duas pessoas que decidem, sem grandes aparatos, partilharem pontos de vista, este livro é, então, o resultado de uma conversa que se quis solta, sem pretensões mas que reserva mensagens, e apontar de dedos, fulcrais no que à sociedade portuguesa diz respeito.
 

Debruçando-se sobre temáticas (tão) relevantes como a educação, a família, o amor, a política, os autores dialogam amplamente sobre os seus diferentes critérios definidores, com o cenário de fundo do medo inerente de cada um. Porque parece estar sempre lá. Um medo que tolhe os movimentos, por vezes mais básicos, incapacitando a pessoa a agir como um dia previra. Como se a esperança fosse um capricho ao qual os portugueses também já não podem aspirar.
 
"Cada vez mais as pessoas
estão isoladas em ilhas."
(Coimbra de Matos)
  
Também a solidão, o desemprego, a depressão, a depressão profissional, ecoam na conversa. Vamos seguindo, um pouco atónitos, tal é o grau de concordância com tudo o que por aqui se diz. Se reclama. Estamos num mundo cada vez mais virado para dentro, solitário, feito de pessoas assustadas e que, à força disso mesmo, se fecham num medo que eventualmente as protegerá de algo ainda pior.
 
A sensação com que ficamos ao ler os diferentes trechos desta maravilhosa conversa é, sobretudo, a de desprendimento. Sim. Permite olhar para nós mesmos, enquanto cidadãs e cidadãos portugueses, questionar até que ponto nos revemos com certas passagens, nos condoemos com certas situações, nos zangamos com as passividades que ninguém parece querer mudar para, num vislumbre novo, podermos ter esperança.
 
 
"O amor enlaça tudo: está no começo, no percurso e no destino. É o segredo: da alegria e da felicidade. Portanto, amar, não «amar loucamente», como dizia Florbela Espanca, mas amar mais e melhor; e sempre."
(Coimbra de Matos)
 
Um livro que recomendo não só pela pertinência dos temas mas, também, pela sabedoria com que os autores expõem os diferentes pontos de vista. É nessa base que o leitor terá a oportunidade de, igualmente, aprofundar os seus e quiçá, recuperar alguma esperança que sinta perdida.



Save me

 
;)
 
 

Estante de Serviço #6

segunda-feira, 10 de outubro de 2016

 
Autoestima baixa
_______
 
Rebecca
Daphne du Maurier
 
 
"(...) Por vezes, é claro, não há ninguém a quem culpar a não ser a si próprio. Se se sujeitar a uma crítica constante, minando a sua crença em si mesmo e a suas próprias opiniões, reconhecerá um espírito idêntico no narrador de Rebecca, de Daphne du Maurier - que, a propósito, permanece incógnito, sublinhando a falta de fé que ela tem no próprio direito de existir. A partir do minuto em que ela assume o seu papel como segunda Mrs De Winter, senhora de Manderley - a bela propriedade rural de que é proprietário Maxim, o seu marido, mais velho e mais sofisticado - torna-se desajeitada ao máximo, deixando constantemente cair as luvas, batendo nos copos e tropeçando nos cães, corando e pedindo desculpas e roendo as unhas ao mesmo tempo que anda em bicos de pés por todo o lado. Vestida e penteada de forma inadequada e tendo consciência disso, não faz ideia de como dirigir uma grande casa com criados e não faz nada para conseguir aprender, entregando ingenuamente a sua autoridade à governanta, Mrs Danvers - um espetro de mulher rancorosa - que «adorava» a primeira Mrs De Winter e que fica radiante por encorajar a autossabotagem da jovem. «De segunda categoria», «estranha», «insatisfatória» - estas são todas formas como ela, direta ou indiretamente, se descreve a si mesma. Não é de surpreender que, quando Mrs Danvers lhe sugere que se atire da janela do quarto, ela esteja quase de acordo em fazê-lo.
A heroína de Rebecca é uma órfã - então, mais uma vez, podíamos culpar os seus parentes falecidos pela falta de autoestima. Mas vê-la rebaixar-se, comparar-se desfavoravelmente com a elegante, inteligente bela Rebecca, a primeira mulher do marido, torna-se difícil de engolir passado um bocado, pela forma tão clara como ela torna as coisas piores para si mesma. Qualquer pessoa com a mesma tendência para se amesquinhar com autocrítica corará de identificação culpada ao ler este romance, e jurará acabar com um comportamento tão destrutivo de uma vez por todas.
 
 
 
 
Um livro absolutamente cativante, que nos prende para sempre, Rebecca é uma história de enganos em que pela autoestima tão frágil da personagem, o mais relevante e determinante lhe passa ao lado. E tudo isso, por essa tão gritante falta de fé em si mesma.
Belíssimo! 
 


A Campânula de Vidro (Sylvia Plath)

domingo, 9 de outubro de 2016


Desde adolescente que a Sylvia Plath assumiu um lugar de encantamento nas minhas leituras. Talvez pelo lado sombrio, tão típico da adolescência, o meu fascínio foi-se adensando na leitura não só dos seus poemas como, também, da história da sua própria vida. Repleta de dissabores, tão encaixados na ideia fabricada do poeta atormentado. E ela era. Era também, inegavelmente, especial.
 
Mais do que um livro que fala sobre o abismo e a queda numa forte depressão, esta história reflete os meandros do terreno em que aquela doença, muitas vezes, começa a crescer.
São muitas as ilações do que, enquanto leitora, poderei retirar do que acabo de ler, no entanto, a relação com a mãe é determinante no declínio de Esther, que parece nunca entender, concretamente, o que se passa com ela.
 
Uma das principais características da depressão passa, precisamente, por esse alheamento e certeza de que nada se passa. Há uma confusão, apenas. E uma profunda tristeza. Mas a palavra, a definição, a coisa em concreto parece nunca se verbalizar. E esse sim, é um dos critérios definidores mais credíveis de quem sofre de uma doença que tem dentes, que morde, que esmiuça, que engole e escurece os dias, sem permitir questionar.
 
O livro parece dividido em duas partes.
A jovem Esther, talentosa estudante, ganha bolsas de estudo com frequência, até ao momento em que, fruto do seu trabalho e empenho, ganha uma bolsa que lhe permitirá trabalhar durante um mês numa revista com sede em Nova Iorque. Nesta fase, descobrirá amizades, nunca cimentadas profundamente, vontades nunca antes reveladas e o desejo de permanecer sempre ausente da sua casa de infância.
 
O segundo momento é pautado quando não é aceite para o Curso de Escrita Criativa, durante o Verão. E este é o momento prioritário da história: aquele Verão. E o seu declínio.
Fechada em casa com a sua mãe, Esther parece virar-se para dentro e todos os sintomas que eventualmente lhe pareciam inerentes ao seu temperamento, um cinismo limpo e cortante, uma língua afiada e uma estreiteza face aos sentimentos mais intrincados, sobem a galope e manifestam-se de uma forma a que, arrisco-me dizer, nenhum leitor ficará indiferente.
 
A escrita de Sylvia Plath é linda. Um livro lindo, com um tema obscuro. Só por aqui, a junção de coisas tão díspares e a capacidade da autora em casar a beleza de uma história tão triste com momentos de tanta sensibilidade, só me fazem enaltecer o meu antigo encantamento.
 

"Quer ela o soubesse ou não, tinha sido a responsável por todos os caminhos errados que tomara ao longo da vida, e por tudo o que de mau me acontecera desde então." p.127

 
A contemplação do abismo, a conquista deste sobre ela, resultam numa tentativa de suicídio. Uma tentativa desesperada de dizer aquilo que não conseguiu escrever nos seus inúmeros contos ou, melhor ainda, a falha de não apontar as culpas a quem sempre sentiu ser a razão da sua desgraça.
 
Num reflexo de amargura, de desespero e profunda tristeza, «A Campânula de Vidro» afigura-se à mais vertiginosa procura de si mesmo. O quanto profundo se pode cair na tentativa de nos encontrarmos, de perceber o conceito dessa liberdade tão almejada e até que ponto depende de nós começar de novo.
 
 
 
Um livro altamente biográfico, retratando um Verão que a própria Sylvia viveu, repleto de mensagens que induziram muitos críticos às mais variadas opiniões e, possivelmente, com muitos erros de interpretação.
Quanto à minha experiência de leitura, só o poderei recomendar com as ambas as mãos alertando para a sua profundidade, tristeza, cinismo e, simultaneamente, rasgos de uma esperança quase vã.
 
Impossível de esquecer e como já esperava, «A Campânula de Vidro» figura, agora, como um dos livros da minha vida.
Leia também.

Na Campânula de Vidro

quinta-feira, 6 de outubro de 2016

Love and Misery

 
Fonte: Pinterest
 

Psicologia(s) #6

terça-feira, 4 de outubro de 2016





Constatação: Ah pois é.

Entre dar... e ser totó

segunda-feira, 3 de outubro de 2016

 
R. Varela: Há uma fronteira entre dar e... ser totó? (Risos.)
A. Coimbra de Matos: Isso sim é parvo. Mas que parvoíce. (Risos.)
R. Varela: Qual é a fronteira? (Risos.)
A. Coimbra de Matos:
Quando não há reciprocidade. Aí, se acaba o amor e se começa a ser parvo...


 
In Do Medo à Esperança | Raquela Varela e António Coimbra de Matos | p.42

Ler(-te) em Português de Outubro

sábado, 1 de outubro de 2016

 
 
Chegou o meu mês. Com ele chega, também, Vergílio Ferreira e a sua primeira história: "A Curva de uma Vida". Vamos ler.
 
 
Poderão ler mais informações sobre este desafio pessoal, aqui
 
Ler(-te) em Português de Janeiro, aqui
Ler(-te) em Português de Fevereiro, aqui 
Ler(-te) em Português de Março, aqui
Ler(-te) em Português de Abril, aqui
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