Pigtopia (Kitty Fitzgerald)

domingo, 8 de novembro de 2015


"A Mamã diz que o papá tinha corpo e alma de porco, que era um porco enorme e porcalhão que a emporcalhou à força, e que depois se afastou a trote pelos campos fora quando compreendeu o que se estava a tramar." (p.9)
 
Assim começa «Pigtopia» de Kitty Fitzgerald. Um livro sensível e peculiar, sobre a amizade improvável de um homem de 30 anos, com macrocefalia, e uma adolescente reservada.
Macrocefalia é o termo que carateriza a pessoa com uma cabeça anormalmente grande.
 
Jack Plum vive isolado do mundo, com uma mãe hostil e magoada pelas agruras de uma vida que não desejou e um marido que supostamente desapareceu.
Se para a mãe, esse homem é indigno e motivo de todos os seus males, tendo-lhe dado Jack como filho, feio e defeituoso, para aquele, o seu pai era a lufada de ar fresco e a única fonte de amor que tinha. Foi o pai que igualmente o ensinou a amar os porcos, a criá-los e a aprender os mistérios curiosos desses animais. Uma ligação eterna a um pai que desaparecera sem deixar rasto.
 
Holly Lock é a adolescente reservada. Não se vê refletida nos mesmos desejos das amigas, nem tão pouco nas medidas do corpo que teimam em não acompanhar ritmos previstos.
A Holly prefere a botânica, procurando flores e plantas nos bosques, às escondidas, aumentando esse amor com o poder que só os segredos dão.
 
Também num segredo, a vida de Jack centra-se no amor e criação dos porcos tentando, nesse hábito metódico e quase religioso, estreitar a ausência dos afetos que tanto estima. A ausência de um pai que sempre o amou. É com os porcos que recebe o que tanto precisa e desenvolve capacidades que ninguém acreditaria possíveis.
 
É com essa capacidade que o seu coração certeiro escolhe Holly para ser a sua amiga. Ele sabe que ela é diferente de todos os outros, entenderá e, mais do que isso, se encantará com o Palácio dos porcos. Nasce assim uma amizade memorável.
 
O livro de Kitty Fitzgerald foca de uma maneira muito especial o conceito de amizade entre uma pessoa com uma limitação física que, contudo, é detentora de uma inteligência emocional arrepiante, capaz de o orientar a si e aqueles que decidiu amar.
 
Não gostei do fim, confesso. No entanto, «Pigtomia» é um livro que se destaca precisamente pelo poder da amizade, pela sua capacidade transformadora e pelos sonhos que são partilhados, numa troca certa que permite saber, garantidamente, que nessa partilha, jamais morrerão.
 
Boas leituras.

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