O livro branco (Han Kang)

quinta-feira, 27 de junho de 2019


Quando tiver a oportunidade de ler «O Livro Branco», de Han Kang, perceberá que está perante um livro quase humano. Parece uma ideia estranha, não me dirá? Mas a verdade é que este livro tem uma vida que pulsa, ausente, lá dentro. Tem dois olhos atentos, quatro mãos firmes e perdidas simultaneamente, é branco e perde-se no brilho de uma cor que, tanta gente, muitas vezes, nos diz que por ser branco, não é propriamente uma cor.
 
Através de uma vivência pessoal, a morte daquela que seria a sua irmã mais velha, Han Kang concentra-se em reflexões sobre o que poderia ter sido. Se a irmã não tivesse morrido horas depois da sua mãe, sozinha em casa, ter dado à luz, teria Han nascido?
 
Decidiu escrever uma lista de coisas brancas e a partir daí as recordações surgiram, latentes, dando origem a uma espécie de escrita experimental, um livro igualmente experimental, pela desordem aparente, pelas ideias que nos parecem distantes mas que se encontram e fundem, magistralmente, num mesmo lugar: a cor branca da melancolia.
 
Neve. Sorriso branco. Cabelos brancos. Gelo. Arroz. Sudário.
 
Através de uma fina camada de palavras brancas, a autora conduz-nos a uma história partilhada de dúvida e saudade, a necessidade de encontrar um lugar próprio no mundo como condição determinante aos corações que sempre se querem (ilusoriamente) ajustados.
 
No dicionário, em sentido figurado, a cor branca é aquela que «encerra todas as cores». Assim é o livro branco que Han Kang nos escreve: encerra na sua brancura todas as cores, todas as possibilidades da vida, umas aparentemente certas, outras nem tanto, nesse limiar de quem marca os pés num monte de neve para, segundos mais tarde, se apagar a certeza de um lugar.
 
É isto a vida, uma possibilidade infinita e nós, meros pontos de interrogação, brotamos dessa mesma imprevisibilidade. Assustador ou redentor,  «O Livro Branco» é a prova disso numa sentida partilha sobre a perda, a saudade e a dor de quem vislumbra, numa luz branca de clarificação, as incertezas e suposições que eternamente nos irão definir.
 
Recomendo. Muito.
 


Seja feliz,

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