Os Enamoramentos (Javier Marías)

terça-feira, 15 de setembro de 2015



Que livro lindo. Lindo!
 
 
Se há coisa da qual ninguém pode fugir - mesmo que tente - é do amor. E nem tentem dizer-me que se podem enclausurar em casa e, dessa forma, não serão apanhados nesse rede tentadora e, na mesma medida, tão assustadora.
Nada pode travar a força dessa coisa. Quem vos garante, meninas ou meninos, que um dia o carteiro desespere na campainha, vocês têm de sair, e eis que o amor surge? Ah pois é. (risos. muitos risos!)
Está em todo o lado. Como um demónio.
 
São várias as coisas que tenho para partilhar convosco sobre este maravilhoso livro. Enamorei-me por Javier Marías, desde logo, pela capa do livro. Sei que é um elemento que deverá ser secundário a um bom leitor, no entanto, há quem diga que o amor quando vem, vem pelos olhos adentro. E, quem sabe, este meu deslumbramento por uma capa que acho tão linda, era já um prenúncio de enamoramento bem maior.
 
Enamoramento é pois o tema central desta lindíssima história, que provoca pontos de reflexão tão bons, mas tão bons, que acredito que me acompanhará durante muito, muito tempo.
 
A história que Javier Marías nos revela centra-se em María Dolz e no fascínio que sente por um casal, apaixonado, que todas as manhãs contempla no café que ambos frequentam.
O casal perfeito. Harmonioso. E que junta uma palavra quase mágica, fundamental em assuntos de coração:
 
"Havia camaradagem, e sobretudo convicção." (p.17)

Havia certeza naquele casal, e era precisamente essa certeza que encantava María. Alimentava-se dessas imagens de cumplicidade gratuita, convicta, de um casal que não precisa de provar nada a ninguém.
O amor alimenta-se das entranhas de quem o sente, de quem o dá. De fora, nada pode receber. Aquele casal parecia estar convicto disso mesmo, deslumbrando de dia para dia María Dolz, ansiando estar mais perto no dia seguinte, ouvindo diálogos que comprovassem a magia que os olhos testemunhavam.
 
Que existe magia na vida, não tenhamos dúvidas. Mas tal como o sagrado e o profano, há uma mistura ténue de ambos, presente na vida e na pressa dos dias. Assim, de um momento para o outro, o profano de uma vida tão amorosa que roçava o sagrado, revelou-se instantaneamente com o assassinato, incompreendido de Miguel Deverne. O marido perfeito. Morto à navalhada.
 
"Alguém está agora vivo e depois está morto, e no meio nada, como se se passasse sem transição nem motivo de um estado para outro." (p.85)

Com a morte de Miguel, María ganha a coragem de falar com Luísa, a mulher perfeita. A morte tem destas coisas, acelera os relógios. Deixa-me apressar, antes que me apanhe a mim também.
A partir deste momento, estão os dados lançados a uma jornada imparável, surpreendente e, acima de tudo, imprevisível.
Nada contarei sobre o enredo, pois acredito que spoilers aqui é tal qual uma navalhada cruel.
Se querem ser deslumbrados, como eu fui, têm mesmo de ir já a correr (podem ir a correr que merece o esforço) comprar e ler.
 
Mas há, no entanto, mais uma coisa ou outra que não me abstenho de partilhar, que é substancial: esse enamoramento, a fraqueza que provoca e, paralelamente, a força que vai comprar a lugares que não lembram ao Diabo.

"(...) convém distinguir entre os dois [amor e enamoramento] embora se confundam não são a mesma coisa... O que é muito estranho é sentir um fraco, uma verdadeira fraqueza por alguém, e que no-la produza, que nos torne fracos. É isso o determinante, que nos impeça de ser objetivos e nos desarme para sempre e que faça que nos rendamos (...)" (p.285,286)

É precisamente essa fraqueza o centro desta história. Sobre o poder daquelas pessoas que nos prendem com um olhar, tantas vezes indiferente, mas que prendem e enfraquecem. Que nos fazem dizer maravilhas de um arroz de cabidela (quando o detestam!) só para garantir uma harmonia tola e desejada, às vezes, nem se sabendo bem qual ao certo.
Mas de pequenas coisas assim, essa fraqueza vai-se impondo através de um pilar que enterra e ao mesmo tempo aumenta esse enamoramento.
Esse buraco, sem qualquer alicerce, é justificado pela incapacidade de agir. Que se congelem os minutos e a probabilidade de acontecimentos futuros. Nada mais.
Porque o cérebro sabe tudo, a mente estrutura cada ação na medida correta daquilo que é realmente. Sem adornos. Sem galanteios baratos. Sem nada.
Mas o coração, esse, congela. Passivo.
Enamorado.
 
 
 Muito. Muito. Muito recomendado!
 
 Boas leituras.
 
Ao som de: "Another Love" | Tom Odell


7 comentários:

Unknown disse...

Este está na minha lista :)

Carlos Faria disse...

Pois tenho ouvido falar muito bem deste romance, nunca li nada do autor, mas de facto o que me tem afastado é precisamente saber que é uma história de enamoramentos, por norma não desgosto do tema amor nas obras, mas tenho um certo preconceito se este é o assunto central da obra é como aquela questão dos livros românticos cor de rosa, sinto que é para mulheres, é preconceito mesmo e serei eu quem o terá de vencer. Quem sabe se este livro não será um bom medicamento para esse problema.

Su disse...

Fiquei curiosa :D

Beijinhos e boas leituras

Denise disse...

E que bem que está, Patrícia :)
Vale muito a pena.

Boas leituras!

Denise disse...

Carlos,

Pois, compreendo perfeitamente o preconceito de que fala. Mas penso que este livro, escrito por um homem e que assume um diálogo feminino de uma forma tão natural, pode ser uma boa experiência. É muito mais do que enamoramento e romance cor-de-rosa. A escrita é soberba, arrancando ao leitor reflexões verdadeiramente profundas sobre as emoções. Acredite, é muito mais do que um simples romance.
Vai surpreender-se!

Boas leituras!


Su!

Aposta e segue essa curiosidade. É um excelente investimento :)
Javier Marías é um autor para conhecer, sem dúvida.

Beijinhos!

Raquel disse...

Olá!!

Li esta opinião e fiquei com imensa vontade de dizer duas coisas:
- Sempre que venho ao teu blog descubro livros maravilhosos! Tenho mesmo de começar a fazer uma "wishlist" baseada no teu blog :) (e aprender a escolher livros como tu...)
- Adoro as tuas opiniões! Não só por serem muito bem escritas (porque são), mas porque consegues escrever de uma forma que consegue chegar o leitor, fazendo-o sentir o que tu sentiste! Foi o que me aconteceu com esta opinião. Não li o livro, mas já estou a ficar "enamorada" por ele.
Agora vou ter mesmo de arranjar o livro, não é? :)

Beijinhos e boas leituras

Denise disse...

Olá Kel!

Muito obrigada! :)
Quanto a este livro em específico, ai sim, vale mesmo muito a pena e podes começar a correr atrás dele! eheh
É um livro surpreendente e, a certa altura, tão imprevisível que nos faz refletir imenso sobre aquilo que uma pessoa é capaz em matérias de coração.
Corre!! ;)

Beijinhos e boas leituras **

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