Butcher's Crossing (John Williams)

quinta-feira, 14 de julho de 2016


John Williams surpreendeu ao fazer-se surgir das cinzas, inesperadamente, com o tão aclamado «Stoner». Pessoalmente, arrebatou-me completamente. Hoje, fico como o Marco Paulo e os seus dois amores. Honestamente, a ter de escolher qual das duas obras gostaria mais, não conseguiria dizer-vos.
 
Por muito que se apontem diferenças, nítidas, em ambos os livros, consigo perfeitamente notar as personagens cinzentas com que outrora o leitor (se é um desses afortunados que já se cruzou com Stoner) confrontou na primeira obra editada em Portugal.
 
Andrews decide largar tudo e ruma para Butcher's Crossing, terminando junto de Millers, caçador de búfalos, encimando aquela que seria, mais do que uma aventura, a jornada que mudaria irremediavelmente os contornos da sua vida, até então, sem linhas firmes.
 
Vejamos, a história não é mais do que sobre um homem que desiste do seu rumo fixado na rotina típica de uma vida ordenada para, momentaneamente, partir numa caçada de búfalos na tentativa de se reencontrar a si mesmo.
 
É nesse reencontro que o leitor cruzará com personagens irremediavelmente partidas por dentro. Não é só Millers e o seu sonho antigo de percorrer aquela determinada zona de caça, em guerras antigas com McDonalds, cujo orgulho lhe assume a bravura do próprio nome, mas também Charley Hoge e o receio escondido na mão que a neve, um dia, fez questão de lhe roubar. O alemão Schneider, que também os acompanhará ao longo de vários meses, mostrará o lado destemido da vida e as consequências disso mesmo.
 
Numa amálgama de várias intempéries inesperadas, para lá da meteorologia, John Williams, com este grupo de personagens, permite relembrar a sensibilidade da sua escrita e os fantasmas que, tão bem, invoca em cada um deles. Fantasmas que lhe condicionam cada passo, cada movimento, cada decisão, na certeza de um amanhã diferente mas nunca presente: um futuro sempre imerso num nevoeiro frio, distante, de quem se procura fugindo irremediavelmente.
 
Na personagem principal de Andrews, a insustentabilidade do coração revela-nos uma história de arrependimentos, mágoas e orgulhos mal colocados. E como tudo na vida, a desarrumação, a longo prazo, gera o caos. Dentro ou fora do espírito, há um caos que começa. Imaginem quando esse caos se instala no espírito.
 
Tem de arder.
Tem de se exorcizar.
E que comece, depois, um amanhã.
 
 
Continuo encantada com todo este, quase, misticismo em torno das obras de John Williams. Em cada uma delas encontro essas sombras, essa inquietude que assusta e prende, simultaneamente.
 
Sublime.
Um livro que recomendo com muitas, muitas mãos.
 
Boas leituras.

2 comentários:

Carlos Faria disse...

Pois... muitos elogios tenho ouvido de Stoner, agora grandes elogios a este, na verdade nunca li nada deste escritor, a curiosidade começa a impor-se, apesar de eu por norma fugir às ondas do sucesso no momento e andar noutras marés mais discretas. ;-)

Denise disse...

Olá Carlos :)

Compreendo bem. Ultimamente tenho sido acometida por essas "ondas" mas quanto a John Williams, vale a pena apostar.

Beijinhos e boas leituras!

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