Castelos de Cartão (Almudena Grandes)

terça-feira, 9 de abril de 2019


Porque não? Porque não três pessoas amarem-se entre si? Quem nos diz, afinal, que têm de ser dois? Não foi três a conta que Deus fez?

Quando terminei de ler Almudena Grandes, muitos foram os pensamentos em torno desta temática que tão magistralmente nos traz: o amor a três. 

«Castelos de Cartão» narra a história de Maria José, Marcos e Jaime, estudantes de arte, pintores, jovens corações encantados pela força, que ainda lhes restaria, da arte e da procura da fama. Sem rodeios, todos se apaixonam ao mesmo tempo, os três, numa simbiose inicialmente muito estranha mas que o prazer que dela nasce, não deixa espaço para eventuais estigmas sociais.

Sabe caro leitor, esta é uma bonita história de amor. É que nisto do amor, a tendência tão nossa de apontar dedos, ora vejam lá vejam lá bem, dois homens e uma mulher, nus, numa cama. Sabe Deus. Onde anda a moral caída deste Mundo, minha nossa Senhora da Aparecida?

Este livro retrata muitas coisas mas, acredite, é acima de tudo o confronto com as nossas próprias limitações, as nossas próprias crenças tão enraizadas no certo e errado que nosso senhor Jesus nos foi transmitindo pelas bocas e gestos de um pai e de uma mãe ainda, e para sempre, em formação. É isso sim, o lidar com o estigma de três corpos que se amam em conjunto, à sua maneira, ao seu jeito tão próprio e íntimo. 

Se esta história de amor acaba bem? Não.

Por terem sido três pessoas enamoradas entre si ou porque Deus quis apenas que o amor fosse bilateral, fiel como as palas dos burros que quando postas, os obrigam a olhar só em frente? Será isso mesmo? O que quis Almudena mostrar-nos com estas três inesquecíveis personagens?

Escorrem questões, da tinta fresca de cada quadro pintado por eles. Marcos, o genial e desistente da vida, Jaime, o provinciano sedutor que não falha o seu lugar na cama e Maria José, mulher perdida em si, nos seus medos, detentora de um talento preguiçoso, enorme, mas tão preguiçoso e igualmente desistente.

"Quando o ano lectivo acabou, aquela era a primeira e única história séria, intensa, verdadeira, que eu tinha tido em toda a minha vida."

A arte, o sexo, o amor e a morte embarcam numa pequena história que não deixa nada por dizer. Há espaços vazios para que eu, você e outra pessoa qualquer, integre em si mesmo. O espaço vazio, e tão único, em que todos os amores - ah, são tantos e variados! - possam encaixar devidamente na vida de cada um, com os receios, com os medos, com as preguiças, com as incertezas.

Foi nessa incerteza que Maria José dedicou o seu futuro. Estacionou todas as esperanças num passado fugaz que lhe mostrou a realidade da felicidade, que existe de facto, mas uma vez ida, vai para sempre.

"Era demasiado amor. Demasiado grande, demasiado complicado, demasiado confuso, e arriscado, e fecundo, e doloroso. Tanto quanto eu podia dar, mas mais do que me convinha. Por isso se desmoronou. Não se esgotou, nem se acabou, nem morreu, desmoronou-se apenas, veio abaixo como uma torre demasiado alta, como uma aposta demasiado alta, como uma esperança demasiado alta."


Uma bonita história que nos oferece ar, declínio, amor e morte. A oferenda da demasia, a que todo o amor que se preze, sempre invoca.
Demasiado, demasiado amor.


Gostei imenso deste pequeno livro, desta grande história.
Faça o favor de ler.





Seja feliz,

2 comentários:

Bárbara Ferreira disse...

Tenho este para ler, comprado em Sevilha. Só ouço maravilhas da autora :)

Denise disse...

Maravilhas justificadas :)
Lê e vem cá contar-me tudo!

Beijinho, Bárbara

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