O primeiro livro do escritor brasileiro Geovani Martins (Editado pela Companhia das Letras Portugal) ganhou, desde logo, o seu lugar ao sol e isto deve-se, em grande parte, à temática que traz a lume: a vida dos moradores das favelas.
A sua estreia, de um homem que também ele viveu a realidade das favelas, da pobreza e do preconceito associado, parece oferecer um novo realismo à literatura brasileira.
«O Sol na Cabeça» é um livro de pequenos contos e o fim que os liga é, sobretudo, o preconceito social como um sol tórrido de Agosto a queimar-nos a cabeça desprotegida. Resta-me a esperança de que essas queimaduras sejam uma comparação aquela em que acredito ser a intenção do autor: alertar para as consequências tristes do preconceito, da adolescência perdida, do abandono e do nojo social tão magistralmente tocado nas personagens que aqui encontrará.
Há um pouco de tudo e esse tudo é triste apenas por existir. Não sou inocente ao ponto de acreditar que um dia tudo mudará, radicalmente. Ainda assim, é urgente a máxima da empatia aplicada à prática: a capacidade de nos colocarmos nos sapatos do outro e perceber, na sua pele, o impacto de um olhar de lado, gestos de quem evita e a repugnância (tantas vezes) injustificada.
Qual o impacto numa criança que se sente marginalizada pelo olhar assustado de uma mulher que, tal como ele, se encontra na paragem do autocarro? Qual o impacto de percebermos quais os sentimentos que se entranham ao sermos assaltados e o nosso coração queimar de medo pelo amor da nossa vida? Qual o impacto, a pressão que não terá, de vivermos à margem da sociedade e, na falta de melhor, compactuar com a única coisa que está à mão? É que, muitas vezes, o que está à mão parece ironia de destino, um caminho tortuoso que pesa ainda mais no preconceito dos outros.
Sobre este livro, Milton Hatoum disse: "Se Lima Barreto estivesse vivo, sem dúvida leria com emoção as narrativas deste livro tão necessário em tempos de intolerância, ódio e ignorância.”
É este o peso desse sol que nos queima a cabeça. É a urgência de percebermos que por muitos anos e supostas evoluções do mundo, a intolerância, o ódio e a ignorância mantêm-se, lamentavelmente, na ordem do dia. O que fazer? Como suportar esse calor que os egos sempre tão inflamados fazem questão de perpetuar?
Faça o favor de ler e inspire-se.
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