Imagine a possibilidade de regressar ao passado. Gostaria? Aceitaria? E se sim, o que faria?
O livro de Toshikazu Kawaguchi é uma bonita história de fantasia que nos deixa a importante lição de abrir bem os olhos enquanto a vida passa por nós.
São muitos os dias em que a maioria de nós passa numa espécie de inconsciência, permitir-se deixar a vida correr sem questionar o andamento da mesma.A roldana vai andando, os dias vão passando, os desafios vão surgindo e, com eles, a nossa capacidade para fazer alguma coisa. Olhamos para o lado, distraídos, na esperança de que ninguém nos esteja a ver a passividade nas entranhas.
Surge o terreno fértil ao arrependimento, depois. O tempo que já não volta e aquilo que, afinal, poderíamos ter feito de forma diferente.
É neste contexto que as personagens deste livro nos entram porta adentro em direção a um café peculiar onde circula a lenda de que ali é possível regressar ao passado. Mas não é tão simples como parece. A lenda é uma verdade, sim é, mas existem regras para que o desejo se materialize: há um lugar específico do café para tal, ocupado por uma mulher fantasma que por ali passa o tempo a ler; não se pode alterar o que aconteceu no passado; há o tempo limite após um café ser servido e o momento em que arrefece. Quem arriscar o café frio poderá, também, ver-se transformado em fantasma. Será um preço demasiado alto a pagar pela visita a um tempo que já foi e que, pior ainda, não é susceptível de qualquer mudança?
É aqui que vive a beleza deste livro. A necessidade de controlo corre-nos no sangue. A busca por respostas apaga-nos a capacidade de enxergar todo o processo que nos leva a um destino sonhado. É essa desatenção, muitas vezes, que não nos permite a ação no tempo certo. E tempo certo, só mesmo o presente.
Ainda assim, permanece o desejo de voltar ao lugar das coisas vividas. O centro de uma oportunidade torna-se maior do que qualquer desconfiança e tudo isso, apenas e só, para viver uma vez mais o que poderia ter sido, por breves minutos, a vontade impera sempre nesse sentido.
Este é um livro escrito à mão da nostalgia, dos tempos perdidos, do arrependimento dos dias traçados a caneta permanente. O autor, de forma delicada, conduz-nos ao âmago da fragilidade humana, dos medos, dos anseios e das esperanças. É como um mapa desenhado sem atenção, uma rota que se cria ao sabor dos dias sempre tão iguais até que, quase por magia, algo de drástico acontece e um empurrão faz-se firme e ruidoso no pedido, urgente, de redesenhar caminhos.
Não é isto, viver? Desenhar. Apagar. Voltar a desenhar e encontrar, esperançosamente, a rota que nos leva adiante, a um futuro promissor de quem ousou olhar mais além.
Uma delicada história, feita de personagens igualmente delicadas e frágeis, todas elas, no ponto comum dos que desejam mudar alguma coisa fazendo as pazes com o passado que já foi, e pasme-se, jamais voltará.
Recomendo.
Seja feliz,
Sem comentários:
Enviar um comentário